As Canárias são o principal ponto de chegada dos migrantes e os centros de acolhimento estavam saturados há muito. O Executivo definiu uma fórmula “solidária” para distribuir quatro mil crianças pelo país
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O Governo espanhol aprovou uma lei para distribuir por todo o país mais de quatro mil dos cerca de seis mil menores migrantes que chegaram nos últimos meses às ilhas canárias. Os centros de acolhimento da região estavam saturados há mais de 18 meses e o Governo Regional pedia há muito uma solução ao Executivo Nacional.
Os menores vão ser distribuídos de acordo com uma fórmula baseada no número total de população de cada região, o rendimento, a taxa de desemprego, as condições de acolhimento disponíveis e o número de menores acolhidos anteriormente. Para financiar a medida, o Governo aprovou um pacote de 100 milhões de euros.
Desde o passado verão que as Ilhas Canárias vivem uma situação de emergência migratória, com a chegada de mais de seis mil migrantes menores, acolhidos de forma muito pouco digna devido à sobrelotação dos centros. “A situação obrigou à criação de recursos de emergência, em lugares que não são adequados, muitas vezes com pessoal sem a formação suficiente”, diz Sara Collantes, especialista em migrações da UNICEF. “Não se pode garantir uma atenção individual, há atrasos na escolarização e as necessidades psicossociais não são abordadas. Isto mergulha estas crianças em sofrimento e compromete o seu desenvolvimento num momento fundamental das suas vidas.”
Até agora, a lei vigente deixava nas mãos das diferentes regiões a decisão de acolher ou não os menores, quando os territórios recetores, como as Canárias, Ceuta e Melilla, estavam sobrelotados. Com a nova norma, isto passa a ser obrigatório, num mecanismo “solidário, objetivo e flexível”. “Espanha tem que responder como Estado a um fenómeno estrutural como as migrações”, explica Fernando Clavijo, presidente do Governo Regional. “É um acordo que respeita os direitos humanos, os tratados internacionais, os direitos das crianças e que demonstra a utilidade da política.”
Polémica
Depois das contas feitas, veio a polémica porque Madrid é a comunidade que mais menores deve acolher (cerca de 700) e a Catalunha a que menos deverá receber (perto de 20). Segundo os critérios estabelecidos, a Catalunha já acolhe mais mil menores do que os lugares que tem disponíveis nos seus centros, pelo que não pode ser sobrecarregada, enquanto a capital tem ainda disponíveis mais de mil vagas. Madrid acusa o Governo de escolher um critério que favorece os catalães, para garantir o apoio do partido de Carles Puigdemont (sem o qual seria impossível aprovar a medida), e já anunciou que vai recorrer ao Tribunal Constitucional.
As regiões têm agora um mês para informar o Governo dos dados de acolhimento de menores de cada uma, para que o cálculo possa ser feito de forma definitiva. Ainda não se sabe quando vai começar a deslocação dos menores, mas poderia acontecer já dentro de dois ou três meses.
No meio da disputa política, a UNICEF sublinha que é importante não esquecer que há quatro mil menores que já não podem esperar mais. “A situação é gravíssima. O sistema de proteção da infância nas Canárias e em Ceuta é completamente insustentável e isto gera sofrimento na vida das crianças e viola os seus direitos de forma clara”, insiste Collantes.
