O Executivo vai proibir também a difusão de informação falsa às mulheres que queiram interromper voluntariamente a gravidez
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O Governo espanhol vai apresentar uma proposta no Congresso dos Deputados para incluir o direito ao aborto na Constituição. A iniciativa surge como resposta à moção do partido de extrema-direita Vox, aprovada na Câmara Municipal de Madrid pelo Partido Popular, que obriga os profissionais de saúde a informar as mulheres de uma “síndrome pós-aborto”, que não tem qualquer evidência científica.
“A síndrome pós-aborto, do qual não se fala, implica um trauma profundo para a mãe, que inclui depressão, alcoolismo, anorexia e bulimia, disfunções sexuais, auto-lesões, agressividade e uma taxa de suicídio sete vezes mais alta do que nas mulheres que não abortaram", disse a deputada do Vox Carla Toscano, na Câmara Municipal de Madrid.
De acordo com a iniciativa, os profissionais de saúde que atenderem as mulheres que queiram abortar têm a obrigação de as informar das consequências desta suposta síndrome, que não está comprovada cientificamente.
As críticas não se fizeram esperar e a ministra da Saúde, Mónica García, ameaçou mesmo tomar medidas legais para travar a decisão. "É uma síndrome que não existe, não há qualquer diagnóstico clínico que demonstre a sua existência. Vamos estudar qual é a legalidade desta ação e perceber as consequências jurídicas que pode ter", disse.
Esta sexta-feira, através da rede social X, Pedro Sánchez anunciou a intenção de incluir o direito ao aborto da Constituição de forma a impedir que “os direitos e as liberdades das mulheres” sejam colocados em causa. Além disso, o primeiro-ministro anunciou também a reformulação da lei existente para proibir, de forma expressa “a difusão de informação falsa às mulheres”.
“O que aconteceu na Câmara de Madrid é gravíssimo e demonstra o alinhamento do Partido Popular com o Vox no que toca ao retrocesso de direitos adquiridos, neste caso, pelas mulheres. O que posso dizer é que o Governo de Espanha vai garantir que este direito seja preservado, independentemente das ações políticas de determinadas Câmaras Municipais”, disse Sánchez, antes da reunião da Comunidade Política Europeia em Copenhaga.
Contradições no PP
No lado do Partido Popular, o presidente da Câmara de Madrid, José Luís Martínez Almeida, esforça-se para tentar explicar o sucedido. Se esta quinta-feira defendia “não haver nenhum problema em prestar informação às mulheres”, um dia depois, já reconhecia que “não há qualquer evidência científica da existência de uma síndrome pós-aborto” e, apesar do que foi aprovado na assembleia municipal, garantia que “nenhum profissional de saúde será obrigado a dar essa informação”.
Ainda assim, questionado sobre a vontade do Governo de blindar este direito na Constituição, cuja reforma implica uma maioria de três quintos no Congresso dos deputados e, por isso, precisa dos votos do PP, o partido rejeitou a iniciativa.
Em entrevista à Rádio Nacional de Espanha, Juan Bravo, deputado do Partido Popular, frisou que “o aborto já está garantido por lei” e que, hoje em dia, “uma mulher que voluntariamente tenha de tomar a decisão de abortar, pode fazê-lo”, mas que, para o PP, “não se trata de um direito”.
“Temos uma lei e uma norma que garante o aborto, e isso é suficiente. Ir além do que já está estabelecido, só pretende conseguir uma confrontação”, insistiu.
Atualmente, a França é o único país a incluir o direito ao aborto na Constituição. A medida foi aprovada em março do ano passado.
