Maria João Lobo Antunes votou esta manhã, bem cedo, na Triadelphia Ridge Elementary School, uma escola primária em Glenelg, entre Baltimore e Washington DC, no Maryland. É professora de Criminologia na Universidade de Towson. Após o voto, recebeu a TSF na casa onde vive com o mardo e 4 filhos.
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Quando votou na escola local básica deste lugar com um par de milhar de habitantes no Condado de Howard (330 mil habitantes) a afluência já dava sinais de que este vai ser um dia intenso: “Fomos votar cedo, saímos de casa logo às 7 da manhã, por causa dos miúdos, e já estavam pessoas a votar. Havia duas maneiras de votar, podia-se votar diretamente na máquina ou então com papel pis. Eu escolhi papel, votámos e viemos para casa e agora estamos aqui nesta expetativa de saber quem é que ganha.”
Reconhece que “há muita ansiedade, especialmente entre as mulheres. As mulheres sentem que isto é importante e que não há grande alternativa se não votar e esperar que o Trump não ganhe”.
Há, neste dia, várias eleições além da Presidência. Os americanos, e também aqui neste círculo eleitoral, votam para o Senado, para a Câmara dos Representantes, para juízes. E também há uma votação sobre direitos reprodutivos, que a portuguesa nascida em Nova Iorque considera especialmente importante. Filha de um médico, Maria João considera que há “nuances que eu acho que não se não se conversa o suficiente: o direito ao aborto é um direito de cuidados reprodutivos de saúde, mas mais: direito à contraceção, que é algo que não se fala. Os republicanos tendem a ver o contracetivo como só para prevenir a gravidez, mas as mulheres na menopausa, mulheres com problemas hormonais precisam de aceder a esse tipo de medicamentos e (os republicanos) estão a tentar restringir. Isso é outro direito da mulher que tem um grande efeito na qualidade de vida”.
A criminologista elabora sobre o que pode estar em causa: “Uma das cadeiras que eu leciono, é Teorias de Crime em que se tenta explicar porque é que indivíduos, porque é que os os miúdos cometem crimes? Uma coisa que é preciso perceber é que o crime é um conceito social, ou seja, dou o exemplo para eles trabalharem: imagina que uma miúda de 10 anos que é violada, precisa de fazer um aborto, mas não pode no Estado em que está. E depois vai para outro e é considerado crime. Que teoria ou o que é que vamos utilizar para explicar esse tipo de crime? Porque não é um crime igual a homicídio”. Reconhece que, por vezes, “são conversas que são muito difíceis, particularmente porque temos grupos de alunos bastante conservadores”.
Ou seja, na opinião de Maria João Lobo Antunes, esta eleição tem a ver com "a preservação e o restabelecimento dos direitos das mulheres - da responsabilidade e da esperança. Mais importante ainda, o reconhecimento de que os EUA são um país de diversidade e inclusão que não pode ser apagado por uma retórica de ódio e medo. As vozes de todos os que foram marginalizados foram ouvidas pela campanha de Harris, respeitadas e apoiadas. Não há lugar para o racismo, a misoginia, a xenofobia, a homofobia ou a transfobia na América de 2024. E reitera o que tem sido um dos slogans da campanha de Kamala: “Nós não vamos voltar atrás.”
Para ela, Donald Trump significa “o medo”. A questão é que sabemos que, “ao menos as políticas da Kamala não nos vão matar, não nos vai pôr em perigo, não vai criar restrições económicas, especialmente para as mulheres”.
Recordo-lhe que Donald Trump já foi presidente quatro anos e… “Sim, sobrevivemos. Mas repara que com o Donald Trump, ele conseguiu pôr 3 pessoas no Supremo Tribunal. São três juizes ultraconservadores e novos, são jovens”. Para um cargo que é vitalício e que determina muita da legislação importante no país. E remata: “foi por causa do Donald Trump que a lei do aborto foi alterada”.
A professora entende que “isto é uma conversa em que não é tanto Republicanos versus Democratas. O Trump não tem nada de republicano. Não tem nada, é um ditador, é um ‘would be dictator que quer ser ditador e não consegue. Penso que a razão por que ele está candidatou-se este ano à Presidência é para evitar a prisão”.
Que pessoa vê em Kamala Harris? Com ponderação, mas não poupando em elogios, a criminologista responde: “Acho que é muito inteligente e que se interessa pelo bem-estar do povo. Há uma crítica que eu oiço muito por parte dos meus alunos em relação à Kamala, é que ela muda muito de opinião, que ela era contra o fracking e depois que mudou de opinião. Mas uma coisa que eu tento sempre incutir aos alunos é que nós podemos mudar de opinião, podemo-nos educar e avançar e evoluir naquilo que pensamos em relação às questões”.
Maria João Lobo Antunes pensa que essa “é uma qualidade nos líderes porque permite que não haja extremismos e que nós, como cidadãos, possamos mudar de opinião”. E assim, um presidente pode melhor gerir “a maneira de representar todos”.