A Amnistia Internacional diz ter "provas irrefutáveis" de que está em curso uma "limpeza étnica" do povo rohingya na Birmâni.
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"A Amnistia Internacional revela novas provas que apontam para uma campanha de terra queimada em larga escala em todo o estado de Rakhine (Arracão)", escreve a organização em comunicado, acrescentando que "as forças de segurança e multidões de justiceiros estão a queimar aldeias rohingya inteiras e a fuzilar pessoas ao acaso à medida que estas tentam fugir".
A acusação da AI baseia-se na análise de dados de deteção de incêndios, imagens de satélite, fotografias e vídeos no terreno, bem como entrevistas a dezenas de testemunhas oculares em Myanmar (antiga Birmânia) e no vizinho Bangladesh.
"As provas são irrefutáveis -- as forças de segurança de Myanmar estão a incendiar o estado de Rakhine numa campanha para expulsar o povo. Não duvidem: isto é uma limpeza étnica", disse a diretora de Resposta a Crises da Amnistia Internacional, Tirana Hassan.
Para a responsável da AI, "há um padrão claro e sistemático de abusos".
"As forças de segurança cercam uma aldeia, disparam sobre pessoas a fugir em pânico e depois queimam casas completamente. Em termos legais são crimes contra a humanidade -- ataques sistemáticos e deportação forçada de civis", salienta Tirana Hassan.
A Amnistia Internacional diz ter detetado, desde 25 de agosto, "pelo menos 80 incêndios de grandes proporções em áreas não habitadas do estado de Rakhine. Foi nessa data que o exército birmanês lançou uma operação militar na sequência de ataques contra esquadras de polícia por parte do Exército da Salvação Rohingya Arakan (ARSA, na sigla em inglês).
Os fogos, adianta a ONG, foram detetados "ao longo de vastas áreas predominantemente rohingya", dentro do estado de Rakhine.
A organização falou com um rohingya de 27 anos da localidade de Inn Din, que descreveu a forma como os militares birmaneses, a 25 de agosto, cercaram a aldeia e dispararam para o ar. Depois entraram na aldeia e atiraram a eito contra os habitantes que fugiam.
O homem disse que se escondeu na mata e observou a forma como os militares permaneceram três dias em Inn Din, pilhando e queimando as casas dos residentes.
De acordo com a AI, as autoridades birmanesas negam que as forças de segurança sejam responsáveis por deitar fogo às casas. "De forma algo incrível, alegam que os rohingya têm incendiado as próprias casas", indica a ONG no seu relatório.
"As tentativas do governo de desviar a culpa para a população rohingya são mentiras de uma ponta à outra. A nossa investigação indica de forma cristalina que as forças de segurança, ao lado de multidões de justiceiros, são os responsáveis por queimar as casas dos rohingyas", conclui Tirana Hassan.
Segundo a ONU, cerca de 400.000 rohingyas refugiaram-se no Bangladesh desde finais de agosto para fugir à repressão do exército birmanês, que lançou uma operação militar no oeste do país após uma série de ataques da rebelião rohingya.
As autoridades da Birmânia, de maioria budista, não reconhecem a cidadania aos rohingya, cerca de um milhão de pessoas, impondo-lhes múltiplas restrições, incluindo a privação da liberdade de movimentos.
Na quarta-feira, o Conselho de Segurança da ONU pediu "medidas imediatas" para acabar com a violência sobre os rohingyas na Birmânia. Sobre o mesmo assunto, o secretário-geral da ONU, António Guterres, considerou que os "crimes contra a humanidade" que sofrem os rohingyas na Birmânia podem ser considerados limpeza étnica.