Jornalismo deve responder a uma "revolução cultural, social e económica, com consequências imprevisíveis"
Declaração de Cartagena das Índias que encerra o VIII Congresso de Editores de Meios de Comunicação da União Europeia, América Latina e Caribe foi aprovada por unanimidade. Exige "atitude atenta e flexível" mas também "Idealismo, compromisso, determinação e coragem" face aos desafios geopolíticos e da IA.
Corpo do artigo
Dezenas de jornalistas reunidos nos últimos dois dias na cidade do Caribe colombiano constataram que um “momento de profunda transformação e de revolução cultural, social e económica, com consequências imprevisíveis”, exige do jornalismo e dos seus profissionais “uma atitude atenta e flexível por parte dos meios de comunicação social”. O "idealismo, compromisso, determinação e coragem" são encarados como a principal estratégia do jornalismo e "juntos sentimo-nos mais fortes para o defender".
O oitavo Congresso de editores da União Europeia, da América Latina e das Caraíbas reafirma que a informação “é um direito inalienável de todos os povos, um instrumento essencial para assegurar a democracia e, com ela, a liberdade, a igualdade, a cultura, a ciência, a convivência pacífica e o desenvolvimento”.
Mas, encarando de frente os mais diversos poderes, os jornalistas consideram a informação jornalística “essencial para denunciar a violência, as guerras, as invasões, os poderes que provocam a perseguição ideológica, as ditaduras em geral e as máfias e o terrorismo em particular, bem como para se defender das pressões dos agentes económicos que, com o seu poder, condicionam os conteúdos jornalísticos”, algo que vem acontecendo, nomeadamente em sociedades democráticas, com inusitada frequência.
Os membros do Congresso apelam à proteção dos jornalistas no exercício da sua profissão, de forma a “garantir o direito dos cidadãos a uma informação responsável, longe de discursos de ódio e de discriminação”. Num mundo globalizado, acentua-se o valor do papel do “jornalista como o profissional mais adequado para canalizar a informação, sujeito aos seus exigentes códigos deontológicos e ao compromisso social com o bem comum”.
No meio de tantos desafios e mudanças emocionantes, o jornalismo deve “continuar a desempenhar o seu papel essencial como referência, como legado dos valores fundamentais reflectidos na Declaração dos Direitos do Homem, e na sua honestidade intelectual deve proteger as suas fontes, não tolerar a censura, nem responder a pressões de qualquer tipo”. O trabalho do jornalista deve pautar-se pelo ”escrutínio de todos os poderes e pela procura de clareza nas suas reportagens”.
Os jornalistas reunidos neste congresso internacional na Colômbia manifestam a sua “total solidariedade para com todos os cidadãos afectados pelos abusos de poder e, em especial, para com os colegas e os meios de comunicação social que realizam o seu trabalho a partir dos locais de conflito”. Apoiam igualmente todos os jornalistas e profissionais da comunicação social que “oferecem a sua vida pela verdade ou são vítimas de censura, perseguição, ameaças ou prisão por parte dos poderes instituídos”.
Uma chamada para a ação dos poderes públicos
O congresso de Cartagena das Índias alerta para a importância do uso responsável e ético da IA e entende que é "necessário responder adequadamente ao previsível avanço exponencial de tecnologias como a Inteligência Artificial (IA)", devendo ser promovida uma "regulamentação mais rigorosa em áreas como os deepfakes e os algoritmos, bem como o respeito pelos direitos de autor".
O congresso de jornalistas europeus e latino-americanos defende a "aplicação de medidas para proteger os conteúdos noticiosos digitais recém-publicados de serem utilizados para a introdução de IA generativa durante um período definido (48 horas) após a sua publicação inicial"; exige que os titulares de direitos autorais recebam "uma remuneração adequada dos fornecedores de IA generativa pela utilização dos seus conteúdos"; salienta que o "ónus da prova deve ser transferido para os fornecedores de IA para demonstrar a utilização legal do conteúdo" e apela à necessidade de renovação das autorizações legais para que os fornecedores de IA generativa utilizem o conteúdo dos sítios Web "para fins de prospeção de texto e de dados, garantindo mecanismos de auto-exclusão aplicáveis sem afetar a indexação dos motores de busca". Mais, os jornalistas defendem que "os fornecedores de IA devem ser responsabilizados pelos seus resultados".
A Declaração final do congresso "exige a necessidade de sistemas de 'fake check' para a verificação das fontes como garantia básica para o exercício do direito à informação e a aplicação da mesma legislação penal sobre crimes de opinião às plataformas de redes sociais, uma vez que estas exercem a mesma responsabilidade social que os meios de comunicação social".
Os jornalistas reunidos na capital da região colombiana de Bolivar, comprometem-se a "denunciar qualquer interferência dos legisladores nacionais e dos organismos supranacionais na autonomia editorial que ponha em causa a independência e a diversidade da informação".
Conscientes de que "temos de nos reposicionar como indústria e como profissão", os jornalistas assumem ser necessário "encontrar os meios para obter recursos transparentes e suficientes para nos sustentarmos, para apoiar a tecnologia necessária, para pagar a investigação ou para assegurar a nossa defesa em tribunal contra ataques injustos".
Acima de tudo, os profissionais deste ofício pretendem responder à desinformação com "mais e melhor jornalismo. Temos de responder com meios de comunicação livres", com iniciativas como o EDITORED, associação que congrega os editores representados no congresso, qual "cola de apoio e liberdade que nos une indefetivelmente num compromisso de apoio e unidade de ação".
Destacam também a importância de "acordos profissionais participativos; de empresas justas que promovam a economia circular, o respeito pelo ambiente e, muito fundamentalmente, o compromisso com a igualdade de género"; assumem que é preciso ajudar especialmente "as novas gerações, os socialmente marginalizados, os mais fracos".
Mais do que nunca, cabe ao jornalismo desempenhar o seu papel "face a governos que, numa mistura de populismo, xenofobia e pensamento mágico", se revelam "anti-democráticos ou extremistas. Num contexto euro-americano, cabe-nos prestar especial atenção à mudança nas relações internacionais, destacando a civilização ocidental representada pela União Europeia e pela América Latina e Caraíbas na defesa dos direitos humanos e da democracia".
Comprometem-se igualmente a "monitorizar a atribuição transparente de publicidade estatal, que não deve ser utilizada com base em preferências políticas, mas antes e acima de tudo com base em normas profissionais reconhecidas".
Esta declaração de Cartagena das Índias sublinha a "necessidade de uma resposta proactiva e colaborativa aos desafios do atual ambiente global".
Os jornalistas que se reuniram no Congresso que termina esta quarta-feira, afirmam estar "numa única guerra, a guerra da verdade, lutamos pela decência e pela democracia, e a única resposta adequada é sermos mais fortes todos os dias no nosso trabalho".
Assim, reiteram o compromisso de oposição "à intolerância e ao ódio, e mantermo-nos firmes contra a violência, a repressão e o abuso de poder. As nossas armas são as nossas palavras, as nossas culturas locais são o nosso maior tesouro". Em particular, comprometem-nos a defender "a língua espanhola e o português, uma vez que os meios de comunicação social são os principais canais para a sua divulgação e promoção em todo o mundo", garantindo "a correção e o uso adequado de ambas as línguas, das suas diferentes variedades dialectais e do resto das línguas ibero-americanas, favorecendo a sua acessibilidade e tornando-as uma ferramenta fundamental para combater a desinformação".
Na conclusão do texto da Declaração de Cartagena das ìndias, o "idealismo, compromisso, determinação e coragem" são a principal estratégia do jornalismo e assim, juntos, os presentes no congresso, "sentem-se mais fortes para o defender".