Kaja Kallas avisa Trump e Putin que acordo de paz na Ucrânia sem Europa e Kiev "simplesmente não funcionará"
Os EUA exigem um maior envolvimento europeu na despesa da NATO para garantir a "paz através da força”. Aliados europeus reticentes sobre contactos entre Trump e Putin
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A chefe da diplomacia europeia rejeitou esta quinta-feira qualquer acordo de paz na Ucrânia que não inclua a Europa e Kiev, alertando que uma solução negociada “nas costas” de ambos "simplesmente não funcionará". A posição de Kaja Kallas surge em resposta às recentes movimentações da Administração Trump e do contacto direto, por chamada telefónica entre Washington e Moscovo, visando uma resolução rápida do conflito.
"A Europa e a Ucrânia são fundamentais para qualquer solução. Sem nós à mesa, qualquer acordo fracassará porque a sua implementação não será possível", afirmou Kallas, lembrando que a política de paz em troca de concessões políticas e territoriais já falhou no passado.
“É claro que qualquer acordo feito nas nossas costas não resultará. Qualquer acordo precisará de incluir também a Ucrânia e a Europa, e é evidente que a política de apaziguamento, falha sempre”, sublinhou Kaja Kallas, considerando que não há alternativa ao apoio contínuo a Kiev.
A posição de Kaja Kallas alinha-se com as críticas do ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, que classificou como "lamentável" a estratégia dos Estados Unidos de abrir concessões antes mesmo do início formal das negociações.
Os líderes europeus têm expressado uma crescente preocupação, dada a possibilidade de um entendimento entre Trump e Putin, deixando a Ucrânia numa posição de vulnerabilidade e forçando concessões territoriais. Bruxelas insiste que qualquer acordo deve garantir não só a integridade territorial da Ucrânia, mas também mecanismos que impeçam a Rússia de lançar futuras agressões.
O presidente do Conselho Europeu, António Costa, frisou que “a paz na Ucrânia e a segurança da Europa são inseparáveis”, alertando que “a paz não pode ser um simples cessar-fogo”.
“A Rússia não pode continuar a ser uma ameaça para a Ucrânia, para a Europa e para a segurança internacional”, afirmou António Costa, sublinhando que “não haverá negociações credíveis e bem-sucedidas, nem uma paz duradoura, sem a Ucrânia e sem a UE”.
O secretário-geral da NATO, Mark Rutte alerta para o risco de um novo "Minsk 3" e apela à unidade transatlântica, alertando para os riscos de um acordo frágil que possa permitir à Rússia lançar futuras ofensivas.
"Temos de garantir que, quando as conversações começarem, a Ucrânia esteja na melhor posição possível", afirmou Rutte, destacando a necessidade de um acordo "duradouro" e que evite uma repetição dos falhanços dos anteriores Acordos de Minsk.
Questionado sobre as críticas da chefe da diplomacia europeia e do ministro alemão Boris Pistorius às cedências iniciais da Administração Trump, Rutte evitou entrar em confronto direto, mas sublinhou que a prioridade deve ser fortalecer a posição da Ucrânia antes de qualquer negociação. "Sabemos há dias que uma conversa entre Trump e Putin era iminente. Agora, temos de garantir que qualquer desfecho seja sustentável", afirmou.
A reunião dos ministros da Defesa da NATO concentrou-se também no reforço da capacidade de produção militar da Aliança. Rutte sublinhou que, com o aumento dos orçamentos de defesa, os países aliados precisam de garantir que a sua indústria militar é capaz de responder à procura crescente. "Já estamos a produzir mais e mais rápido do que em qualquer momento das últimas décadas, mas isso não é suficiente", alertou, considerando que deve ser adotada “uma mentalidade de tempos de guerra”.
Já o secretário da Defesa dos EUA, Pete Hegseth, reforçou a necessidade de os países europeus aumentarem drasticamente os seus orçamentos de defesa, defendendo um investimento mínimo de 5% do PIB. "Os valores são importantes, mas não se disparam valores, não se disparam bandeiras nem discursos fortes. Não há substituto para o poder militar", afirmou Hegseth, deixando claro que Washington espera uma maior participação europeia na segurança da região.
Pete Hegseth diz-se mandatado por Donald Trump para defender "paz através da força", exigindo um maior envolvimento europeu, e sublinhando que os Estados Unidos não continuarão a ser o único pilar da NATO sem um compromisso proporcional dos aliados.
“Precisamos de tornar a NATO grande novamente” (“Make NATO Great Again”), insistiu Hegseth, num eco direto do slogan de campanha de Trump. Além do reforço militar, a Administração Trump defende também uma mudança na forma como os aliados gerem os seus investimentos. "Os nossos dólares, euros e libras precisam de se traduzir em capacidades reais", sublinhou Hegseth, apontando que a produção de armamento deve ser acelerada para garantir um fluxo contínuo de apoio à Ucrânia e uma preparação robusta para futuras ameaças.
Pete Hegseth expressou uma insatisfação antiga de Washington sobre a perceção de que os Estados Unidos têm suportado desproporcionalmente a carga da defesa da Europa, recuperando um alerta feito pelo Presidente Eisenhower, nos anos 50, e acusando os aliados de transformarem os EUA (Tio Sam) no "Tio Otário" ("Uncle Sucker”). “Trump não permitirá que isso continue", avisou o secretário da Defesa.