Os tribunais têm dois meses para começar a aplicar a norma e amnistiar os envolvidos no processo independentista catalão
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A lei da amnistia entrou em vigor esta terça-feira. A norma vai anular a “responsabilidade penal, administrativa e financeira” de todas as pessoas que cometeram delitos relacionados com o processo independentista da Catalunha durante mais de uma década, entre o dia 1 de novembro de 2011 e 13 de novembro de 2023, e foi publicada esta manhã no Boletim Oficial do Estado.
A partir desta terça-feira, os tribunais têm dois meses para começar a aplicar a lei, que estabelece que se devem suspender de forma imediata as medidas cautelares e as ordens busca e captura que estão neste momento em vigor. Neste momento, há ainda cerca de 300 processos pendentes na justiça espanhola referentes ao processo independentista catalão.
Uma dessas causas é a do presidente do Junts x Catalunya, Carles Puigdemont, que tem uma ordem de prisão desde novembro de 2017, data em que fugiu da Espanha para a Bélgica para esquivar a justiça espanhola. Agora poderia voltar ao país, precisamente no momento em que o Parlamento catalão se prepara para realizar o debate de investidura do novo Governo.
Acusado de malversação agravada de dinheiro público e desobediência, Puigdemont terá de esperar para saber se o Tribunal Supremo lhe aplica a nova lei. A amnistia estipula que os delitos de malversação podem ser amnistiados desde que os fundos públicos tenham sido utilizados apenas para financiar atos do processo independentista catalão sem ter havido “um propósito de enriquecimento ou beneficio pessoal” ilícitos.
Os fiscais do Tribunal Supremo têm dúvidas do encaixe do delito de Puigdemont nesta lei e defendem que o “benefício pessoal” não tem de ser estritamente financeiro, por isso, é de esperar que a decisão demore uns dias a ser tomada. Entre os cenários possíveis está o envio do processo para o Tribunal Constitucional ou o Tribunal Europeu, ou até que o Supremo decida não aplicar a amnistia a Carles Puigdemont.
Depois de mais de seis meses de tramitação, a lei foi aprovada no passado 30 de maio com 177 votos a favor, numa sessão parlamentar muito tensa. Agora, a amnistia começa uma nova travessia nos tribunais, onde muitos juízes já manifestaram o seu desagrado pela aprovação da lei.
Longo percurso
Durante o seu percurso no Congresso, o texto da lei sofreu várias alterações e chegou mesmo a ser chumbado com o voto contra do Juntos pela Catalunha, em janeiro. O acordo final só chegaria em março, depois de tensas negociações com o PSOE que modificaram o texto.
As principais mudanças diziam respeito à referência ao “direito europeu e internacional” em vez do Código Penal espanhol, nos crimes de terrorismo, excluídos da amnistia. Assim, fora da lei da amnistia ficaram os “atos que, pelo seu objetivo, podem ser classificados como terrorismo, de acordo com a diretiva europeia de 2017”, e que, por sua vez, “tiverem causado intencionalmente graves violações dos direitos humanos regulamentados nos artigos 2.º e 3.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos”, que se referem ao direito à vida e à proibição da tortura.
As referências ao Código Penal Espanhol foram eliminadas do capítulo que se refere aos tipos de delitos que não se podem amnistiar, que passaram a ser definidos pelo direito internacional.
Fora desta lei, ficam também os delitos de traição, mas apenas se “se tiver produzido uma ameaça real e efetiva, como o uso da força contra a unidade territorial” de Espanha.
Além destas modificações, o Juntos pela Catalunha conseguiu também ampliar o período que abrange a lei: na proposta inicial a amnistia incluía os delitos relacionados com o processo independentista catalão cometidos a partir de 1 de janeiro de 2012, a nova versão ampliou este período a novembro de 2011.
Os delitos de malversação de dinheiros públicos também serão amnistiados desde que não tenha havido enriquecimento ilícito. Este apartado é importante, uma vez que a maioria dos dirigentes catalães foram condenados por delitos de sedição e malversação.
