Pouco depois de Luaty Beirão ter anunciado uma nova greve de fome, o Fórum Lisboa recebeu uma sessão pública de solidariedade com os ativistas angolanos presos.
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Solidariedade para com os 17 ativistas angolanos detidos em Luanda e críticas ao medo de se estragarem as relações políticas entre Portugal e Angola. Na sessão pública da última noite em Lisboa ouviram-se críticas ao regime de José Eduardo dos Santos e às autoridades portuguesas.
O medo em estragar as relações políticas e económicas com Angola foi realçado nas diferentes intervenções dos que subiram ao palco. A eurodeputada do Bloco de Esquerda, Marisa Matias, e a deputada do PS, Isabel Moreira, foram algumas das vozes que criticaram o chumbo do voto condenatório ao regime angolano na Assembleia da República.
Também o historiador José Pacheco Pereira criticou "as cumplicidades de Portugal, de muitos setores em Portugal", com o regime angolano. "Essa cumplicidade é feita pelas piores razões: é cómodo criticar a Síria ou a Birmânia, mas não é cómodo, em Portugal, criticar Angola, porque existem demasiadas promiscuidades e cumplicidades entre interesses que são de ordem económica, por parte de uma elite angolana, cleptocrática. Se alguém perguntar de onde vem o dinheiro é muito difícil responder a não ser pelo exercício do poder político. Isso chama-se corrupção", defendeu.
"Em Portugal hesita-se chamar corrupção àquilo que é corrupção e isso é uma razão suplementar. Compreendo que as relações de Estado para Estado são feitas independentemente do regime político. Portugal, por exemplo, torceu o nariz à Guiné Equatorial e, pelos vistos, acha que em Angola tudo corre bem, que há um sistema judicial independente", acrescentou.
O advogado Ricardo Sá Fernandes considerou que o caso dos 17 ativistas tem "uma raiz política", mas que no processo foram cometidos abusos jurídicos "muito graves", exemplificando com a forma como decorreu o julgamento, o teor da acusação, os "tratamentos cruéis" na prisão.
"São problemas que não são políticos, mas sim de direitos humanos", disse, adiantando ter "consciência" de que o problema fundamental é de "configuração do Estado angolano", que não se resolve de um dia para o outro.
Também o antigo primeiro-ministro angolano Marcolino Moco destacou a "situação caricata" de o Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, "que fugiu da repressão [colonial portuguesa] liderar um Estado que hoje "reprime também jovens" que lutam pela democracia.
Em relação aos 17 ativistas, entre eles o 'rapper' luso-angolano Luaty Beirão, condenados a penas de prisão de até oito anos e seis meses, Marcolino Moco realçou a "coragem" dos jovens, tendo em conta as intimidações que foram e continuam a ser levadas a cabo.
A sessão contou ainda com a presença de Ricardo Araújo Pereira, que considerou "absurda" a situação dos ativistas angolanos e que leu uma sátira que escreveu sobre o tema.
O humorista diz que é simultaneamente fácil e difícil satirizar o regime político em Angola, sobretudo no que diz respeito ao caso dos 17 ativistas. "É fácil porque a situação é tão absurda que quase não é preciso tocar-lhe. São pessoas que são presas por ler um livro, basta dizer isto. Está dentro desta maldade a estrutura da comédia. É difícil porque são pessoas que estão presas e é a vida deles que está em causa. Há sempre um prurido em decidir se o olhar humorístico pode ou não pode posar sobre temas como este. Eu acho que pode".