Músicas do mundo em Marrocos. Até domingo, o Essaouira Gnaoua & World Music Festival leva meio milhão à antiga Mogador

Nelson Santos/TSF
Celebra-se o milenar estilo gnawa, antepassado dos blues, mas também a música de Buika, Ilê Aiyê ou Bokanté. Uma cidade que já teve presença portuguesa, respira miscigenação cultural durante três dias, onde haverá um Fórum de Direitos Humanos com o tema “Marrocos, Espanha e Portugal: Uma História a Olhar Para o Futuro”
Até domingo, 29, a localidade marroquina de Essaouira vai encher-se de música e cor para mais um Gnaoua & World Music Festival. É a 25ª edição de um evento que atrai pessoas de todo o mundo com mais de 400 artistas divididos pelos vários palcos instalados na cidade costeira, antiga Mogador, da medina à praia.
O estilo musical gnawa deriva do grupo étnico com o mesmo nome, de origens subsarianas, escravos trazidos para Marrocos por volta do século XI. É interpretado pelos maâlem (mestres) com, essencialmente, dois instrumentos: o gimbri, um antepassado da viola baixo com três cordas, e as karkabas (ou qraqeb), castanholas metálicas cujo som lembra cascos de cavalos.
No seu registo mais hermético é uma prática espiritual e, supostamente, terapêutica, tendo por fim atingir um transe. A música gnawa esteve perto do ocaso nos anos ’90, marginalizada em Marrocos pela associação a rituais e à mendigagem. Desde 1998, ano do primeiro Gnaoua & World Music Festival, a popularidade do género e da cultura têm sido exponenciais, atraindo visitantes de todo o mundo, ano após ano. Tanto que, desde 2019, a música gnawa é Património Imaterial da Humanidade, fazendo de Essaouira uma “cidade musical”, a exemplo de New Orleans ou Montreux.
Nestes três dias, largos milhares de pessoas vão receber artistas de oito países, isto porque o Essaouira Gnaoua & World Music Festival é muito mais que apenas um evento dedicado ao género autóctone gnawa. As outras “músicas do mundo” este ano vêm do Brasil, Senegal, Espanha, E.UA. ou Palestina. A par das dezenas de maâlems, o cartaz inclui Buika, Rhani Krija, Bokanté, Labess, Issam Kamal & Mazagan, Aïta Mon Amour, Kike Perdomo, entre muitos outros.
Além das actuações “convencionais”, este festival é um autêntico laboratório vivo de experimentação musical através das muito desejadas fusões entre músicos aparentemente distantes. Nesse sentido, destaque
nesta edição para o concerto de abertura onde se juntaram as cores musicais dos maâlems Hassan Boussou e Moulay Tayeb Dehbi de Marrocos, com a performance cénica da La Compagnie Dumanlé da Costa do Marfim, o coletivo Ilê Aiyê do Brasil e o flamenco dos espanhóis Nino De Los Reyes e Sergio Martinez.
Além da música propriamente dita, este festival à beira do Atlântico inclui há já alguns anos a esta parte um Fórum dos Direitos Humanos, este ano subordinado ao tema “Marrocos, Espanha e Portugal: Uma História a Olhar Para o Futuro”. Haverá três mesas redondas onde também se vai discutir o Mundial 2030, organizado, justamente, por estes três países. O músico Carlos Martins, a analista política Maria João Tomás e o investigador Rodrigo Sobral Cunha são os portugueses oradores. A sessão de abertura está a cargo do antigo primeiro-ministro espanhol José Luis Zapatero.
