"Não há sinal de ajuda." Ainda sem água e luz, algumas zonas de Cabo Delgado tentam retomar normalidade após ciclone Chido
Em declarações à TSF, o padre Latifo Fonseca garante, ainda assim, que há sinais de esperança: "As pessoas acreditam que dias melhores virão"
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Mais de duas semanas depois da passagem do ciclone Chido, há zonas de Cabo Delgado, em Moçambique, que ainda não tem água e luz. A ajuda tarda em chegar devido aos acessos que ainda não foram retomados. Ouvido pela TSF, o padre Latifo Fonseca descreve o cenário que encontrou após várias visitas esta manhã.
"Ainda não chegou nenhum apoio, não há sinal de ajuda, então as pessoas continuam com carência de comida, com carência de local para se acomodar, a sorte é que não choveu nestes dias", conta à TSF o padre Latifo Fonseca, sublinhando que ainda há falta de água, assim como de energia elétrica.
"Existem poços artesianos que estão a abastecer nas aldeias, mas quem depende da energia elétrica ainda não tem água", explica.
Ainda assim, há sinais de vida e esperança. O padre missionário garante que os moçambicanos tentam retomar a normalidade: "Há sinais de vida, fiquei surpreendido. São pessoas acostumadas a erguer-se sem muita ajuda, então eu acredito que há também essa força e essa resiliência. Há pessoas a fazer compras. É esse o sinal de que as pessoas acreditam que dias melhores virão."
Latifo Fonseca, que estava de férias em Cabo Delgado, meteu mãos à obra e juntou alguma ajuda para as famílias mais numerosas.
Pelo menos 76 pessoas morreram, uma está desaparecida e outras 768 ficaram feridas durante a passagem do ciclone Chido no norte e centro de Moçambique, indicam dados atualizados este sábado pelas autoridades moçambicanas.
O ciclone Chido afetou ainda 380.147 pessoas, o correspondente a 75.182 famílias, nas províncias de Cabo Delgado, Niassa e Nampula, no norte, e Tete e Sofala, no centro, segundo o novo balanço do Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD) de Moçambique, divulgado hoje, com dados preliminares até às 18h00 (menos duas horas em Lisboa) de sexta-feira.
No balanço anterior, com dados até quinta-feira, o INGD apontava 75 mortos e 329.565 pessoas afetadas, o correspondente a 65.293 famílias, em consequência do ciclone tropical, que se formou em 5 de dezembro no sudoeste do oceano Indício e entrou no domingo pelo distrito de Mecúfi, em Cabo Delgado, "com ventos que rondaram os 260 quilómetros por hora" e chuvas fortes.
Segundo as autoridades, no novo balanço, o ciclone Chido destruiu totalmente 61.561 casas e parcialmente outras 24.980 - totalizando quase o dobro face ao dia anterior -, afetou 52 unidades hospitalares, 26 casas de culto, 11 torres de telecomunicação e 89 edifícios públicos.
Os dados apontam ainda para um total de 109.793 alunos, 1.556 professores, 1.126 salas de aula e 250 escolas afetados, além de 338 postes de energia tombados e 454 embarcações de pesca danificadas.
Moçambique cumpre este sábado o segundo e último dia de luto nacional, decretado pelo Governo, com a bandeira nacional e o pavilhão presidencial içados a meia-haste em todo o território nacional e nas missões diplomáticas e consulares da República de Moçambique.
O Presidente moçambicano lamentou a morte provocada pelo ciclone e a destruição de infraestruturas, incluindo escolas, hospitais e outros edifícios públicos e privados e pediu a solidariedade dos moçambicanos para com as vítimas.
"Vamos imediatamente priorizar o apoio na reposição de abrigos, habitações, alimentação, energia, água e distribuição de sementes, além dos outros apoios que estão a acontecer", declarou Filipe Nyusi, na sua comunicação ao país, alusiva à quadra festiva.
Na sexta-feira, o chefe de Estadi visitou Mecúfi, o distrito mais afetado pelo ciclone, em Cabo Delgado, com registo de cerca de meia centena de mortos e a destruição quase total de casas e infraestruturas.
O ciclone tropical intenso Chido, de escala 3 (1 a 5), atingiu a zona costeira do norte de Moçambique na noite de sábado para domingo, segundo o Centro Nacional Operativo de Emergência (CNOE), mas enfraqueceu para tempestade tropical severa, apesar de ter continuado a fustigar as províncias a norte, com "chuvas muito fortes acima de 250 mm [milímetros]/24 horas, acompanhada de trovoadas e ventos com rajadas muito fortes".
Moçambique é considerado um dos países mais severamente afetados pelas alterações climáticas no mundo, enfrentando ciclicamente cheias e ciclones tropicais durante a época chuvosa, que decorre entre outubro e abril.