O combate à corrupção e à criminalidade surgem no topo das prioridades do novo Presidente do Brasil. Mas Bolsonaro promete ainda uma economia mais aberta e, sobretudo, muito mais liberal.
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"Propomos um Governo decente, diferente de tudo aquilo que nos jogou em uma crise ética, moral e fiscal." Esta é a primeira de muitas promessas de Jair Bolsonaro, no programa com que se apresentou a estas eleições presidenciais. São 80 páginas de promessas de prosperidade, numa linguagem simples - tantas vezes simplória - mas eficaz. Bolsonaro promete um executivo capaz de "resgatar a liberdade dos cidadãos" e que devolva o país "aos seus verdadeiros donos: os brasileiros". Mas o que significa isso, afinal? Eis um esboço do que deverá ser o programa de Governo de Bolsonaro. O homem em quem os brasileiros confiaram.
1. Combate à criminalidade e corrupção
Num país que contabiliza 60 mil homicídios por ano e que viu, só entre 2001 e 2015, mais de 786 mil pessoas assassinadas, o combate à criminalidade foi um dos temas mais discutidos durante a campanha presidencial. E é uma das matérias mais polémicas nas posições que Jair Bolsonaro tem vindo a assumir. Considera a Constituição o principal instrumento no combate ao crime, mas assume também que a quer alterar. Promete que "ninguém será perseguido" e que "todos terão os seus direitos respeitados", ao mesmo tempo que garante dar carta branca à Justiça e que "nenhuma investigação será atrapalhada ou barrada". Sem "interferências políticas", escreve Bolsonaro, para que isso permita "acelerar as punições dos culpados".
No programa eleitoral, o próximo chefe de Estado fala das armas como "instrumentos, objetos inertes, que podem ser utilizadas para matar ou para salvar vidas". Tudo depende, escreve, "de quem as está segurando: pessoas boas ou más". Por isso, Bolsonaro promete mexer no "Estatuto do Desarmamento para garantir o direito do cidadão à legitima defesa". Em entrevista à Band, em setembro último, Bolsonaro afirmou querer "dar posse de arma de fogo para o cidadão de bem, o porte, obviamente, com algum critério".
Para reduzir o número de homicídios, roubos, assaltos, violações e outros crimes, o novo Presidente do Brasil garante que vai investir "fortemente em equipamentos, tecnologia, inteligência e capacidade investigativa das forças policiais". Promete ainda mexer no código penal por forma a "prender e deixar preso". O que, na prática, significa "acabar com a progressão de penas e as saídas temporárias" e "reduzir a maioridade penal para 16 anos".
Às forças policiais acena com mais proteção jurídica para que possam cumprir melhor o seu papel e "tipificar como terrorismo as invasões de propriedades rurais e urbanas no território brasileiro" e acrescenta ainda uma mexida na Constituição para expurgar da lei fundamental "qualquer relativização da propriedade privada".
Transparência e combate à corrupção "são metas inegociáveis" para Jair Bolsonaro, que promete resgatar "As Dez Medidas Contra a Corrupção" propostas pelo Ministério Público Federal e "encaminhá-las para aprovação no Congresso Nacional".
2. Economia
Conservador nos costumes e em tudo o que diz respeito à segurança interna, liberal - ou ultraliberal, para alguns - em tudo o que diz respeito à economia. O próximo Presidente do Brasil considera as economias de mercado como "o maior instrumento de geração de renda, emprego, prosperidade e inclusão social". A fé no liberalismo é tão grande que Bolsonaro acredita piamente ser este o único caminho para salvar "biliões de pessoas da miséria em todo o mundo".
Porque "reduz a inflação, baixa os juros, eleva a confiança e os investimentos, gera crescimento, emprego e oportunidades", escreve no seu programa eleitoral. Para alcançar o crescimento económico prometido, Bolsonaro propõe-se a avançar com um programa de privatizações que, diz, "mais do que uma questão ideológica, visam a eficiência económica, o bem-estar e a distribuição de renda". Bolsonaro acredita que as privatizações vão tornar a economia brasileira mais competitiva e todo o dinheiro que o Estado brasileiro venha a encaixar será utilizado para abater na dívida pública.
Uma segunda linha de atuação, na estratégia económica de Bolsonaro, passa por abrir o Brasil ao mundo. "Facilitar o comércio internacional" para potenciar o crescimento económico a longo prazo e provocar "um choque tecnológico positivo no país" que permita também aumentar a produtividade. Bolsonaro quer reduzir muitas das barreiras alfandegárias que o Brasil tem atualmente, baixando taxas de importação e criando novos acordos bilaterais internacionais.
Promete ainda "uma aposta nas novas tecnologias e uma profunda transformação das empresas e das relações de trabalho", bem como uma "modernização da estrutura produtiva". Do programa económico consta ainda um fortalecimento do mercado de capitais, estímulos à inovação das empresas, um balcão único que permita abrir e encerrar empresas num prazo máximo de 30 dias e uma forte aposta nas "startups".
3. Política orçamental
Reduzir o défice, equilibrar as contas públicas, trabalhar para atingir um superavit primário que ajude a estabilizar a dívida pública. Os objetivos de política orçamental de Jair Bolsonaro, neste particular, não são muito diferentes de qualquer chefe de Estado e de Governo. O que faz a diferença - toda a diferença - são os caminhos para lá chegar.
O combate à inflação, "o maior inimigo das classes mais desamparadas" nas palavras do novo presidente, está no topo das prioridades. Bolsonaro promete fazer os ajustes que se vierem a verificar necessários para garantir um crescimento económico com uma inflação baixa e criação de emprego. Acusa a esquerda de ser a grande responsável pela estagnação da economia e promete um "Governo Liberal Democrata."
Bolsonaro prometeu várias vezes, durante a campanha, uma espécie de reforma do Estado. Uma administração pública que "inchou de maneira descontrolada" com "multiplicação de cargos, benefícios e transferências sem comparação na história do Brasil" levam Bolsonaro a prometer "fazer mais com muito menos" e a criar um "movimento de gestão pública moderna, baseado em técnicas como o Orçamento base zero" e "corte de privilégios".
O próximo Presidente do Brasil promete dar o exemplo na formação do seu próprio executivo que passa de 29 para 23 ministérios. Os gestores públicos passam a ter metas e a terem de justificar a forma como gastam o dinheiro público e os vários organismos do Estado vão sofrer cortes. Bolsonaro quer eliminar o défice público primário já no primeiro ano de mandato e alcançar o superavit no segundo ano.
Para reduzir a dívida pública, o novo Presidente brasileiro propõe-se a privatizar empresas, concessionar serviços públicos e vender imobiliário. Com isso, Bolsonaro espera reduzir em 20% o volume da dívida.
Na Segurança Social, a aposta é na capitalização - sistema que chegou a ser discutido em Portugal. Bolsonaro defende uma diferenciação entre o modelo de previdência tradicional - por repartição - e o modelo de capitalização que será a grande reforma a introduzir pelo novo presidente. O objetivo é dar a possibilidade aos contribuintes de optar pelo "sistema novo ou pelo velho". Quem optar pela capitalização, garante, pagará menos para a previdência. Para acautelar uma mais do que previsível quebra de receita, está previsto um fundo que pretende reforçar a Segurança Social e compensar a redução das contribuições.
Na área fiscal, Jair Bolsonaro promete uma redução progressiva dos impostos, que aconteça paralelamente à redução da despesa do Estado, uma simplificação do sistema fiscal e a descentralização de vários serviços que possam potenciar o aumento de recursos tributários.
4. Educação
Bolsonaro defende um sistema de educação que ajude a melhorar o desempenho escolar dos jovens brasileiros e, sobretudo, que tire melhor partido dos recursos financeiros gastos pelo Estado. Para isso, foi inspirar-se em países como o Japão, Taiwan e Coreia do Sul.
O objetivo é mudar não só o conteúdo mas também o método de ensino. Privilegiar a matemática, as ciências e o português, "sem doutrinação e sexualização precoce."
No programa com que se apresentou aos brasileiros nestas eleições, Bolsonaro propõe-se a apertar a disciplina nas escolas, lembrando que, "não raro, professores são agredidos, física ou moralmente, por alunos ou pais dentro das escolas".
5. Saúde
Deixar de lado a ideologia e apostar em melhores serviços de saúde. Uma frase que dá para tudo e que diz muito pouco sobre o pensamento de Bolsonaro para a área da saúde.
Na verdade, conhece-se pouco das propostas do novo Presidente do Brasil para a área da saúde. No programa eleitoral, Bolsonaro propõe-se a acrescentar mais médicos e expulsar os médicos cubanos.
Para os médicos brasileiros, o candidato vencedor destas eleições promete que será criada a carreira de Médico de Estado como forma de conseguir responder às necessidades nas áreas mais remotas do Brasil.
6. Programa sociais
Uma das promessas, nesta área, é a promessa de pagar o 13.º mês a todos quantos recebem o Bolsa Família. Garantindo ao mesmo tempo que não vai aumentar a despesa, Bolsonaro assegura que o dinheiro virá do "combate à fraude" neste programa social.
7. Aborto e adoção por casais do mesmo sexo
Contra. Num caso e noutro, Bolsonaro fez questão de deixar bem clara a sua posição durante toda a campanha eleitoral. Sobre a liberalização do aborto, o agora Presidente eleito garantiu sempre que seriam vetadas "todas as possíveis propostas para liberar o aborto no Brasil".
Já quanto à adoção por casais do mesmo sexo, em entrevista à Globo, já este mês, Bolsonaro retomou a sua agenda homofóbica, para garantir que a adoção de crianças por casais do mesmo sexo "não existe ainda" e, no que dependesse dele, "não será possível".
8. Direitos Humanos
Bolsonaro promete cortar o financiamento para organizações de Direitos Humanos. Num post que fez na rede social Twitter, em agosto deste ano, afirmou: "Se as ONG de Direitos Humanos querem dedicar os seus esforços à defesa da inversão de valores, aborto, bandidos, etc, que o façam, mas não terão um centavo do Governo se nós chegarmos lá."
9. Forças Armadas
Equipamentos mais modernos, mais veículos e mais armas. Militar na reserva, Jair Bolsonaro dá óbvia importância às Forças Armadas brasileiras, para quem quer recuperar as condições operacionais.
Particularmente preocupado com aquilo a que chama "ameaças digitais", Bolsonaro quer umas Forças Armadas "preparadas, através de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, para combaterem todos os tipos de violência".
E, por todo o tipo de violência, inclui-se o combate ao crime organizado. Bolsonaro quer "uma maior integração entre os demais órgãos de segurança pública, principalmente na estratégia de elevar a segurança de fronteiras" e promete a criação de um colégio militar em todas as capitais de Estado, nos primeiros dois anos de mandato.
10. Liberdade de imprensa
Diz-se um defensor da liberdade de opinião e de informação e contra qualquer regulação ou controlo da comunicação social.
O novo Presidente do Brasil garante que não vai permitir que o Brasil prossiga no caminho da servidão e que o povo deve ser "livre para pensar, se informar, opinar, escrever e escolher seu futuro".