O "erro" de Guterres: "Devia ter sido muito mais político e não apenas humanitário"
Victor Ângelo explica, na TSF, que a questão humanitária levantada pelo secretário-geral da ONU devia "ter sido levantada como uma questão que põe em causa a paz e a segurança internacional".
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O antigo secretário-geral adjunto das Nações Unidas Victor Ângelo entende que o líder da ONU cometeu um "erro" depois de ter invocado o artigo 99.º da Carta das Nações Unidas, afirmando que António Guterres "devia ter sido muito mais político e não apenas humanitário".
"A Carta das Nações Unidas no artigo 99.º fala sobretudo de ameaças à paz e à segurança internacional e o secretário-geral devia ter sido muito mais político e não apenas humanitário e isso parece-me ter sido um erro", defende Victor Ângelo, em declarações à TSF.
O ex-secretário-geral adjunto explica que ao ser mais político, António Guterres estaria a pôr em causa "politicamente o Governo dos americanos", que vetou esta sexta-feira o projeto de resolução do Conselho de Segurança da ONU que exigia um cessar-fogo humanitário imediato em Gaza.
António Guterres recorreu ao instrumento diplomático mais poderoso à disposição de um secretário-geral da ONU, mas o seu objetivo foi travado pelos EUA, que Victor Ângelo acusa de estarem "ao lado do gabinete de Guerra de Israel".
"Era de esperar que os EUA vetassem esta resolução. Os EUA estão, infelizmente, 100% ao lado do gabinete de Guerra de Israel, quando na realidade não devia haver um gabinete de Guerra, devia haver um gabinete Político", aponta.
Victor Ângelo ressalva ainda assim que a "questão humanitária" levantada por Guterres é de facto "fundamental", mas considera que a sua abordagem devia ter sido levada a cabo de outra forma.
"[A questão humanitária] devia ter sido levantada como uma questão que põe em causa a paz e a segurança internacional e não apenas a situação humanitária em Gaza, que é bastante importante, mas que não é exatamente o âmbito do artigo 99.º da Carta das Nações Unidas", explica.
A resolução, da autoria dos Emirados Árabes Unidos e que foi apoiada por dezenas de Estados-membros, foi rejeitada com um voto contra dos Estados Unidos (membro permanente, com poder de veto), 13 a favor e uma abstenção (Reino Unido).
O ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, já lamentou a decisão dos Estados Unidos de rejeitar o apelo ao cessar-fogo em Gaza, lançado pelo secretário-geral da ONU, e insistiu na via do diálogo.
"Naturalmente que lamentamos. Nós tínhamos precisamente apoiado a resolução que está ser vetada", disse João Gomes Cravinho, à Lusa.
Cravinho sublinhou que esta é a posição que Portugal tem assumido e insistiu que é urgente haver um cessar-fogo humanitário.