Siga a TSF até ao Japão. Vai conhecer gente que vive muito, trabalha demais e está a deixar de ter filhos. Para não desaparecer, faz robôs.
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Ninguém diria, ao aterrar em Tóquio, que estamos no país mais envelhecido do mundo. Percebe-se porque são os japoneses tão organizados. Não é uma opção, é a única.
Respiram 38 milhões de pessoas na área metropolitana mais densamente povoada do planeta. Ajuda muito os carros serem quase todos elétricos e silenciosos, mas só se circula a pé porque as pessoas parecem telecomandadas. Seguem no mesmo sentido em filas, com zonas delimitadas para subir a para descer, com marcas para andar à esquerda ou à direita.
O país despovoa-se todos os anos para encher cidades assim. Cidades onde a vida custa muito caro. Onde é preciso trabalhar muito para sobreviver, onde quem não faz horas extraordinárias é mal visto.
E podem ser tantas que matam. Matam por suicídio, de quem acha que não foi capaz de cumprir a sua função. Também matam por exaustão. Casos recentes estão a indignar a opinião pública, os de raparigas jovens, na casa dos 20 anos que não trabalhavam em fábricas. Uma era jornalista, a outra modelo.
O desenho desta nova vida deixa cada vez menos espaço à tradição: casar cedo, engravidar depressa e deixar de trabalhar mal saiba se é menino ou menina.
As japonesas quase nunca voltam ao trabalho depois do primeiro filho. As empresas e a sociedade não gostam; o estado não tem creches suficientes; os pais ficaram muitas vezes para trás, no interior.
Há ainda a velha questão, muito discutida mas nunca esclarecida, de que os japoneses não gostam de sexo. A pornografia é tão banal como as maçãs, ou mais, nem todas as lojas de conveniência têm maçãs...
Entre os japoneses que ouvimos, confirma-se. Há pouco sexo, pelo menos em casa. É comum passar a haver dois quartos de dormir sob o teto de recém-casados. É comum os rapazes darem-se por satisfeitos com as versões eletrónicas do assunto. Quando não, parece que é mais fácil pagar.
Ainda são raros os casamentos sem noivo, mas já há agências especializadas em fornecerem o principal: do padre aos convidados. Dizem que é quase o mesmo, só falta uma peça. A festa dura pouco mas cumpre-se parte do sonho - o vestido.
Os estrangeiros podiam ajudar a curar muitos males, mas não. O mais importante é a integridade da raça e da cultura. São bem-vindos se estiverem, de passagem.
Os idosos arriscam-se a ter de esperar mais pela reforma. A lei diz que é aos 60 anos, mas o cheque com a pensão do governo só chega aos 65. Até lá trabalham. Sobretudo os que não têm um pé de meia avultado nem casa própria.
Entre a pressão social e o défice das contas públicas, o governo vai tentando mudar as regras, sobretudo no trabalho. Mas cortar na produtividade também não é caminho. Não é fácil.
Os robôs surgem como uma salvação mais ou menos mecânica. É com eles que contam para ajudar a cuidar de idosos, conduzir veículos ou fazer descer drasticamente os gastos com saúde.
Talvez até arranjem um que case, mas também é preciso que tenha filhos.