Em declarações à TSF, António Vitorino sublinha que se os números do naufrágio na costa da Grécia se confirmarem, serão atingidos, "ainda antes do meio do ano [de 2023], o número total de mortos e desaparecidos de todo o ano de 2022".
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António Vitorino, diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações (OIM), acusa a União Europeia de usar "argumentos falsos" para justificar a decisão de não aceitar migrantes que tentam chegar à União Europeia através do Mediterrâneo.
Depois do naufrágio ao largo da costa da Grécia de um barco vindo da Líbia, "o mais grave no Mediterrâneo central desde 2017", multiplicaram-se as críticas de organizações não governamentais, que acusam as autoridades gregas e também as europeias de falta de ação no que respeita ao auxílio aos migrantes.
Para António Vitorino, "não havia a menor dúvida de qual era a situação" dos passageiros, por isso, a recusa de auxílio do capitão do barco de pesca, que acabou por morrer, "é completamente inexplicável".
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"Os primeiros contactos com este navio indiciavam já que estava ali uma situação de enorme risco de vida para os passageiros. E a circunstância de várias entidades terem tentado prestar auxílio e esse auxílio ter sido recusado pelo comandante do navio, que aparentemente também pereceu no naufrágio, é completamente inexplicável na minha opinião", afirma o diretor-geral da (OIM).
Em declarações à TSF, António Vitorino sublinha que a lei internacional não está a ser respeitada e, em alguns casos, estão a ser usadas justificações que não são verdadeiras.
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"A verdade é só uma: o direito humanitário e o direito internacional do mar obrigam os assumir responsabilidades em matéria de busca e salvamento", destaca.
O diretor-geral lamenta que argumentos como "um sistema de busca e salvamento seria um incentivo para que as pessoas ainda emigrassem mais" sejam utilizados para justificar a inexistência de apoio aos migrantes. Vitorino acredita que este "é um argumento completamente falacioso, para não dizer mesmo falso", pelo que "essa obrigação do direito internacional tem de ser observada por todos os Estados-membros da União Europeia" e sublinha que a importância da "coordenação a nível europeu".
As autoridades gregas abriram uma investigação para perceber o que está na origem do naufrágio da madrugada de quarta-feira do barco que rumava à Itália, que não seguiu o percurso habitual e escolheu um "caminho mais perigoso".
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"Esta rota a partir do leste da Líbia é muito mais difícil do ponto de vista das correntes e do ponto de vista das condições climatéricas, apesar de nós já estarmos hoje na primavera e, portanto, nesse sentido não haver a expectativa do tempo agreste do inverno. Mas, infelizmente, é uma rota mais perigosa que está a ser usada cada vez mais", afirma o diretor-geral da OIM.
António Vitorino lembra que existe um "limite de resistência no mar", nomeadamente no que diz respeito à hipotermia e até à capacidade de sobrevivência de cada um.
"As fotografias que nós vimos do navio mostram que a maioria das pessoas não tinha coletes salva-vidas e, portanto, isso torna muito improvável a sua sobrevivência e temos relatos verdadeiramente arrepiantes de que haveria mais de cem crianças a bordo e naturalmente são as mais vulneráveis e perecem perante a agressividade do naufrágio", conta.
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Até agora, foram recuperados pouco mais de uma centena de corpos, perto de 104 e há registo de 78 vítimas mortais, no entanto, segundo os relatos que foram chegando de alguns sobreviventes, a OIM aponta que no barco seguiriam "cerca de 400 a 700 pessoas", pelo que Vitorino acredita que a dimensão real da tragédia seja muito maior.
"Isto corresponde também a uma situação de agravamento, em geral, das chegadas. Neste momento, nos finais de maio, chegaram à Itália cerca de 54 mil pessoas, o que representa o dobro das chegadas do ano passado no mesmo período de 2022", explica.
Tendo em conta estes números, a organização teme que 2023 fique para a história pelos piores motivos.
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"Infelizmente este ano, 2023, nós registamos já mais de mil mortos e desaparecidos na rota do Mediterrâneo central, que compara com o total de mortos e desaparecidos do ano passado de todo o ano, de 1400. O que significa que se estes números de que estive a falar do naufrágio se confirmarem, infelizmente, teremos atingido ainda antes do meio do ano, o número total de mortos e desaparecidos de todo o ano de 2022, o que nos faz recear um número verdadeiramente terrificante no final deste ano", lamenta.