"Olá, ditador." As polémicas de Viktor Orbán, o 'Viktator' para húngaros e europeus
A cena acontece em Bruxelas. Jean Claude Juncker cumprimenta os líderes europeus que chegam para mais uma reunião e, de repente, diz: "O ditador está a chegar." Segundos depois, Viktor Orbán aparece na imagem. É assim que o primeiro-ministro húngaro é visto por muitos dos parceiros europeus.
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O presidente da Comissão Europeia não esconde o que pensa de Orbán e com um sorriso na cara cumprimenta-o com um "Olá, ditador". Orbán encolhe os ombros e também se ri.
Digam o que disserem ele é líder incontestado na Hungria e será o único dirigente da Europa de leste de quem conhecemos o nome. Há um ano, o Fidesz ganhava as eleições legislativas com uma maioria de dois terços. Viktor Orbán era escolhido para um terceiro mandato, como primeiro-ministro, o segundo consecutivo.
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O dirigente húngaro é conhecido por desafiar as regras europeias e causar perplexidade pelas leis que adota no próprio país. Quem o conhece diz que ele se alimenta do conflito e das polémicas.
A alteração da Constituição, a interferência no poder judicial, a perseguição aos órgãos de comunicação social e à autonomia académica, a restrição da liberdade de associação e uma lei conhecida como a da escravatura são algumas das marcas da governação de Orbán.
Depois de uma série de decisões do Tribunal Constitucional terem chumbado as novas leis do Fidesz, uma emenda constitucional revogou essas decisões. Em 2011, Orbán avançou para uma Constituição totalmente nova que foi aprovada em nove dias. Em 2015, 11 dos 15 juízes do Tribunal Constitucional já tinham sido confirmados, sem debate, por um Parlamento controlado pelo Fidesz.
A nova Constituição reorganizou o território e introduziu leis eleitorais que distorceram a representação proporcional. Em 2014, o partido teve menos votos do que em 2002 e 2006, quando perdeu as eleições, mas terminou com uma maioria no Parlamento.
Analistas dizem que a pouco e pouco o Governo vai criando uma teia em que as mudanças não parecem muito graves, mas depois, quando vistas em conjunto, a perspetiva altera-se. É esse o caso da criação de uma brigada antiterrorismo que inicialmente tinha restrições constitucionais quanto aos poderes de vigilância. O Fidesz incluiu então vários parágrafos numa lei, aparentemente sem qualquer ligação com o assunto, sobre reservatórios e sistemas hidráulicos, e as restrições desapareceram.
Expulsão do PPE?
Há alterações que passam menos despercebidas - como a lei a que os húngaros chamaram lei da escravatura. No final do ano passado, o Fidesz aprovou o aumento do número de horas extraordinárias que os patrões podem obrigar os trabalhadores a fazer anualmente. Passaram de 250 para 400. Essas horas podem agora ser pagas no período de três anos. Dez mil húngaros protestaram nas ruas, noite após noite, no frio de inverno, para se manifestarem em frente ao Parlamento. Os políticos da oposição prometeram "fazer de 2019 um ano de resistência", mas, apesar da união momentânea, os protestos acabaram por desaparecer e a lei manteve-se.
Orbán justificou a adoção da lei com a redução da população ativa do país e, por isso, já em 2019 o Governo anunciou que as mulheres que tenham quatro ou mais filhos nunca mais pagam impostos. O primeiro-ministro diz que aumentar as famílias húngaras é melhor do que aceitar a entrada de estrangeiros no país.
A luta contra as migrações tem sido uma das bandeiras do Fidesz. No último ano, Orbán lançou uma nova campanha: nas ruas surgiram cartazes com as caras de Soros e de Jean Claude Juncker acusados de quererem obrigar os países da União Europeia a aceitarem refugiados. Esta foi a gota de água para o Partido Popular Europeu (a formação politica de Juncker integra o grupo do PPE), que suspendeu o Fidesz e impôs um conjunto de condições para evitar a abertura de um processo que pode conduzir à expulsão.
Outra das imagens de marca da democracia "iliberal" criada por Orbán é o combate a George Soros. Nos últimos 12 meses essa frente de batalha levou a Universidade Central Europeia a anunciar que vai deixar o país, no final deste ano letivo. A instituição fundada por George Soros cumpriu todos os requisitos impostos por uma alteração à lei do ensino superior, mas mesmo assim não recebeu a certificação.
Ao longo dos anos, o milionário norte-americano nascido na Hungria, gastou milhões de dólares em projetos de educação e da sociedade civil no país, mas, em 2015, quando defendeu o tratamento humano dos refugiados, passou a ser persona non grata.
Foi uma bolsa de estudo de uma organização de George Soros que permitiu a Orbán formar-se em Oxford.