Orçamento Europeu. “Especializámo-nos muito em como gastar. Agora temos de nos especializar em como competir”
Presidente da delegação portuguesa no Comité das Regiões defende novos recursos próprios e dívida comum para reforçar Orçamento Europeu
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O presidente da delegação portuguesa no Comité das Regiões, José Manuel Ribeiro, defende que a União Europeia tem de apostar em novas fontes de receita para financiar o Orçamento Europeu, incluindo “através de recursos próprios”, e a emissão de “dívida conjunta”, para que as verbas da coesão não sejam afetadas.
Numa altura em que Bruxelas pretende reforçar o financiamento destinado à indústria de Defesa, José Manuel Ribeiro apela à vontade política, alertando, em entrevista ao programa Fontes Europeias, da TSF, que é preciso que as populações compreendam o porquê dos gastos militares.
“Temos mesmo de investir em dissuasão”, afirma o também presidente da Câmara de Valongo, considerando que a nova realidade geopolítica, com ameaças diretas à ordem internacional, obriga a Europa a assumir novas responsabilidades e tem de “adaptar-se aos desafios geoestratégicos”, agora que “o mundo mudou”.
“Se tivermos capacidade de nos defender, quem tem a intenção de nos atacar vai pensar várias vezes”, enfatiza o autarca propósito da necessidade de dissuasão, perante a ameaça de Moscovo.
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Coesão
O autarca considera, por outro lado, essencial que se preserve o equilíbrio entre os novos objetivos estratégicos da União e o princípio da solidariedade territorial. E, “há um princípio muito importante que é o de não ferir a Política de Coesão”, adverte José Manuel Ribeiro, frisando que é nesse contexto que defende o reforço do Orçamento Europeu, através de fontes de financiamento adicionais.
“A União Europeia precisa de verbas novas”, afirma, reconhecendo que será “quase impossível” obter consenso para aumentar as contribuições nacionais.
Questionado sobre a hipótese de recorrer novamente à dívida comum, como aconteceu durante a pandemia, assume “ser favorável”, pois considera que se tratou de “uma boa decisão (...) que permitiu reagir a um choque sem memória recente”. E, esta via de financiamento pode voltar a ser utilizada em momentos excecionais, desde que “com vontade política e equilíbrio entre prioridades”.
Execução
José Manuel Ribeiro defende ainda uma mudança de mentalidade na forma como se usam os fundos europeus, mas virada para a competitividade e criação de riqueza. “Acho que nos especializámos muito em como gastar o dinheiro. Agora temos de ser capazes de competir, de sermos mais ricos”, afirma.
No entanto, enfatiza a importância da política de coesão enquanto mecanismo de compensação e convergência, lembrando que Portugal recebeu já “mais de 200 mil milhões de euros” desde a adesão à União Europeia, mas que o rendimento médio per capita continua abaixo da média europeia. Por essa razão considera: “Temos de continuar com a política de coesão, porque ela existe para isso mesmo: para alavancar a nossa capacidade de criar riqueza.”
Apesar dos progressos feitos nos últimos 40 anos, o presidente da delegação portuguesa no Comité das Regiões assinala que é tempo de dar um novo salto e “chegou o momento de sermos exigentes. Temos de andar no grupo dos mais avançados”.
Eficácia
José Manuel Ribeiro aponta a necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos de apoio existentes, designadamente os fundos estruturais e os planos de recuperação nacionais, como o PRR.
“Hoje começa a ser notório que há sobreposições em quase todas as áreas entre os PRR e os fundos de coesão”, alerta, enfatizando que a União Europeia terá de fazer escolhas estratégicas. Para o autarca, a opção de Bruxelas está em decidir “ou se mantêm os dois mecanismos, ou é preciso racionalizar”, pois “a coexistência pode gerar ineficiência”.
O autarca assinala ainda a importância de garantir que os projetos financiados tenham impacto estrutural, uma vez que “muitas vezes investe-se sem ganhos reais”, acabando por se “substituir ‘janelas por janelas’, mas depois vamos analisar o resultado em termos de eficiência e não conseguimos uma mudança estrutural”.
Proximidade
Sobre a perceção dos cidadãos em relação à União Europeia, José Manuel Ribeiro admite que “ainda há desconhecimento” e que isso se reflete, por exemplo, “na baixa participação nas eleições europeias”.
“O nível local é muito diferente, as pessoas sabem quem é o presidente da junta, conhecem-no, falam com ele”, enquanto “a dimensão europeia continua distante para muitos cidadãos”, refere.