Os filhos do Idai têm ambulâncias-madrinhas
Depois da passagem do ciclone Idai, os Médicos com África criaram um programa de ambulâncias na Beira, que reduziu a mortalidade materna em todo o distrito moçambicano.
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Maria Luís estava grávida de gémeos, na altura do Idai.
Os bebés, Manuel e Carmone, têm agora 10 meses.
Um repousa no chão, embrulhado numa capulana. O outro está nos braços da mãe, enquanto Maria Luís recorda o dia do ciclone, no dialecto ndau: "a ventania está a vir, vamos fugir para aquela casa e eu disse se morrer, o destino chegou". A família correu para a casa de uma vizinha, onde encontrou abrigo. Algumas semanas depois, Maria Luís deu à luz, na maternidade de centro de saúde de Chingussura. Os bebés prematuros tinham dificuldade em respirar e, sem dinheiro para pagar uma ambulância, Maria Luís agradece ao CUAMM, os Médicos com África, que transportaram as crianças para Macuti.
A taxa de mortalidade materna aumentou, depois do Idai. O director geral de saúde da Beira, Fino Massalambane, adianta que após o ciclone, morriam sete a dez mulheres em cada 100 partos com complicações, enquanto antes da tragédia, registavam-se apenas duas a três mortes. O aumento de óbitos devia-se, em grande parte, ao mau estado das estradas, atingidas pelo Idai. Por isso, os Médicos com África (CUAMM) criaram um programa de ambulâncias, para transporte das mães e crianças. "Começámos com três ambulâncias nos três centros sanitários com mais partos", explica à TSF Giovanna de Meneghi, responsável das actividades do CUAMM em Moçambique. Depois, com o apoio da União Europeia, o programa passou a ter cinco ambulâncias, que cobrem não só "a população inteira nos cinco centros" mais povoados, mas também as unidades de saúde vizinhas. Quando chove e os buracos nas estradas se tornam crateras inultrapassáveis, o CUAMM chega a trocar a mulher de uma ambulância para outra, para que a paciente "não fique pendurada" a meio do socorro. Com este programa, a taxa de mortalidade materna caiu a pique, para uma a duas mortes em cada 100 mulheres com complicações no parto.
No centro de saúde de Chingussura, toda a maternidade foi destruída pelo Idai. As grávidas tiveram de ser transferidas para outra sala, recorda a directora clínica Laura Estanislau. "Não tínhamos condições. Era normal termos uma cama para quatro doentes ou mais. Os partos eram feitos no escuro, à luz da lanterna. Não havia comunicação, água ou luz".
Um ano depois, o centro de saúde ainda não está totalmente recuperado, mas Alzira já teve o filho, na maternidade de Chingussura. Enquanto segura ao colo o pequeno Abrãao, com três semanas de vida, a jovem de 19 anos conta que ainda estava a estudar, na altura do Idai. Agora, vive em casa da avó, que sustenta a família. O marido, electricista, ainda não arranjou trabalho. "Já estávamos a namorar", mas o Idai aproximou-os ainda mais. Alzira engravidou em Maio do ano passado, cerca de dois meses depois da catástrofe. "É graças ao ciclone que temos este bebé", afirma sorridente.
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