Pelo menos dois mortos após disparos da polícia no dia da tomada de posse do Parlamento moçambicano
Venâncio Mondlane apelou a três dias de paralisação, a partir desta segunda-feira, e a "manifestações pacíficas" durante a posse dos deputados ao Parlamento e do novo Presidente moçambicano. Em declarações à TSF, o investigador Lázaro Mabunda sublinha que a polícia já reforçou a segurança nas ruas da capital, Maputo
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Pelo menos duas pessoas morreram esta segunda-feira de manhã, em Moçambique, após terem sido baleadas pela polícia. A informação foi avançada à TSF por Lázaro Mabunda, jornalista e investigador do Centro de Integridade Pública do país.
"Há alguns focos de manifestações, mas, como está a chover, pode ser que isso não mobilize muita gente para as ruas para as manifestações. Mas há bairros onde já está a decorrer alguma manifestação. Há duas pessoas que já foram baleadas mortalmente pela polícia, esta manhã, ao longo da EN 1", afirmou o investigador.
A cerimónia de tomada de posse dos deputados moçambicanos está marcada para esta segunda-feira. O candidato derrotado Venâncio Mondlane, que regressou ao país na semana passada, apelou no sábado a três dias de paralisação, a partir desta segunda-feira, e a "manifestações pacíficas" durante a posse dos deputados ao Parlamento e do novo Presidente moçambicano, contestando o processo eleitoral.
Lázaro Mabunda não tem por isso dúvidas de que este pedido serviu para "embaraçar" este processo. A polícia já reforçou a segurança nas ruas da capital, Maputo, sobretudo junto ao Parlamento.
"Parece que a tomada de posse vai acontecer, porque a polícia montou um cordão de segurança nas zonas da Assembleia da República e acho que vai acontecer a mesma coisa na próxima quarta-feira", apontou.
Apesar de contestar os resultados das eleições presidenciais, Venâncio Mondlane admitiu entrar num processo de reconciliação com as autoridades moçambicanas e trabalhar numa agenda nacional que venha a ser aprovada no Parlamento. No entanto, a abertura deste diálogo político está dependente do cumprimento de algumas medidas.
“O que quero trazer agora é que tem de haver medidas concretas, que a população sinta no seu dia a dia que este diálogo também está a lembrar-se dela. A minha proposta foi o compromisso nacional de construção de três milhões de casas para jovens em cinco anos, uma verba até 600 milhões de dólares [585 milhões de euros] para as pequenas e médias empresas que sofreram durante o período das manifestações”, declarou Venâncio Mondlane, numa intervenção em direto, a partir da sua conta oficial na rede social Facebook, indicando que as medidas devem ser transformadas em lei.
Além da libertação dos cerca de cinco mil detidos durante as manifestações de contestação dos resultados eleitorais, Mondlane pediu a aprovação, numa lei ou resolução parlamentar, de um compromisso do Governo para a criação de uma linha de financiamento de até 500 milhões de dólares (488 milhões de euros) para micro e pequenas empresas de jovens e de mulheres, em cinco anos.
Na sua intervenção, Venâncio Mondlane apelou igualmente ao tratamento médico e medicamentoso gratuito para todos os que foram feridos durante os protestos assim como a compensação financeira para aqueles que perderam familiares.
“Se isto for feito com estas medidas, eu, Venâncio, sinto que temos uma boa plataforma para iniciarmos em Moçambique um processo de reconciliação, de pacificação”, disse o ex-candidato presidencial, afirmando que quer “o bem-estar do povo”.
Insiste ainda em não reconhecer os resultados anunciados das eleições gerais de 9 de outubro, em que a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder desde 1975) elegeu o seu candidato a Presidente da República, Daniel Chapo, manteve a maioria dos deputados na Assembleia da República e garantiu todos os governadores de província.
A Assembleia da República de Moçambique empossa esta segunda-feira os deputados eleitos à X legislatura, mas dois dos partidos - Renamo e MDM - já anunciaram o boicote à cerimónia, contestando o processo eleitoral.
"O partido Renamo entende que esta cerimónia está desprovida de qualquer valor solene e por isso constitui um ultraje social e desrespeito à vontade dos moçambicanos, pelo que não fará parte desta tomada de posse", afirmou no domingo o porta-voz do até agora maior partido da oposição, Marcial Macome, à margem da reunião da comissão política nacional da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo).
Os 250 deputados eleitos à X Legislatura da Assembleia da República - 28 da Renamo, contra 60 atualmente - foram convocados para tomar posse esta segunda-feira, às 10h00 locais (08h00 em Lisboa), na sede do Parlamento, em Maputo, numa cerimónia solene a ser dirigida pelo Presidente da República cessante, Filipe Nyusi.
Também os oito deputados eleitos pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM) – seis na legislatura que chega agora ao fim - não vão participar na tomada de posse, disse no domingo à Lusa o presidente do ainda terceiro maior partido, Lutero Simango.
Da agenda da convocatória da sessão solene desta segunda-feira consta ainda a eleição do presidente da Assembleia da República para a nova legislatura, cargo atualmente ocupado por Esperança Bias.
A Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder e que mantém a maioria no parlamento) candidatou a ex-ministra Margarida Talapa para aquele cargo. De acordo com informação do secretariado-geral da Assembleia da República, além da ex-ministra do Trabalho e Segurança Social – exonerada de funções na quinta-feira - foram ainda recebidas as candidaturas à segunda figura do Estado moçambicano de Carlos Tembe e Fernando Jone.
Ambos estreiam-se como deputados, pelo Podemos, partido até agora extraparlamentar e que apoiou a candidatura presidencial de Venâncio Mondlane, passando a ser o maior da oposição, com 43 deputados. Contrariando o pedido de Venâncio Mondlane, a liderança do partido já disse anteriormente que os seus deputados irão tomar posse.
