"Pior repressão dos últimos anos." Amnistia Internacional pede fim da violência em Moçambique
A organização refere que "as últimas duas semanas em Moçambique foram marcadas por um derramamento de sangue completamente desnecessário"
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A Amnistia Internacional apelou esta quinta-feira ao Governo moçambicano para pôr fim à violenta repressão pós-eleitoral antes da marcha agendada para esta quinta-feira em Maputo, respeitando os direitos de todos à liberdade de expressão.
Em declarações à TSF, Miguel Marujo, da Amnistia Internacional, lembra que, desde o final de outubro, a violência da polícia já provocou centenas de vítimas. "A Amnistia Internacional tem alertado para a necessidade do Governo de Moçambique pôr termo à repressão violenta e generalizada dos direitos humanos e respeitar esses mesmos direitos de todos à liberdade de expressão e à reunião pacífica, que é aquilo que não se tem verificado praticamente desde as eleições em outubro. Aquilo que se tem verificado é, perante a contestação pacífica de civis de pessoas que se manifestam nas ruas, a polícia tem reprimido de forma bastante violenta aquilo que tem sido essa manifestação de contestação, mas manifestações pacíficas. Para a Amnistia, esta já é a pior repressão dos últimos anos contra protestos no país. Há casos documentados no passado, mas este ano tem sido particularmente grave", explica à TSF Miguel Marujo, afirmando ainda que o Governo moçambicano tem condicionado a liberdade de expressão e o acesso à informação.
"O Governo cortou repetidamente o acesso à Internet em todo o país, bloqueou sítios das redes sociais, bloqueou ou dificultou o acesso a órgãos de comunicação social durante quase uma semana, para também bloquear, de algum modo, não só a livre expressão de pessoas que contestam o Governo, mas também dificultar e muito a informação que circula pelo país", sublinha.
Em comunicado, a Amnistia Internacional considera que a polícia em Moçambique já matou "mais de 20 pessoas e feriu ou prendeu centenas de outras".
A nota da Amnistia Internacional surge no dia para o qual está agendada uma manifestação, em Maputo, convocada pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, contra os resultados eleitorais.
"As últimas duas semanas em Moçambique foram marcadas por um derramamento de sangue completamente desnecessário, uma vez que as autoridades tentaram parar um movimento de protesto pacífico com força letal", afirma a Amnistia.
Citado no comunicado, o diretor regional adjunto da Amnistia Internacional para a África Oriental e Austral, Khanyo Farise, sublinha: "As pessoas nem sequer podem protestar nas suas próprias casas sem correrem o risco de serem atingidas por gás lacrimogéneo pela polícia".
Os protestos foram despoletados pelo anúncio da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de Moçambique, a 24 de outubro, que atribuiu a vitória a Daniel Chapo, apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, partido no poder desde 1975) na eleição para a Presidência da República, com 70,67% dos votos.
Os movimentos de contestação foram desencadeados por Venâncio Mondlane, que segundo a CNE ficou em segundo lugar (20,32%), mas que não reconheceu os resultados, que ainda têm de ser validados e proclamados pelo Conselho Constitucional.
Após protestos nas ruas que paralisaram o país, Mondlane convocou novamente a população para uma paralisação geral de sete dias, desde 31 de outubro, com protestos nacionais e uma manifestação concentrada em Maputo convocada para hoje.
Na nota hoje divulgada, a Amnistia recorda que, além da repressão violenta da contestação, o Governo "cortou repetidamente o acesso à Internet em todo o país" e "bloqueou os sítios das redes sociais durante quase uma semana".
"Homens armados desconhecidos assassinaram duas figuras importantes da oposição [Elvino Dias e Paulo Guambe] e o líder da oposição Venâncio Mondlane está escondido", refere a organização, sublinhando que o Governo moçambicano "tem a responsabilidade primária" de respeitar e defender os direitos humanos.
Apela ainda aos países vizinhos e às organizações internacionais, incluindo a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral e a União Africana, para se pronunciarem "vigorosamente" para evitar mais mortes ilegais e outras violações dos direitos humanos.
"Este capítulo ultrajante da história de Moçambique deve terminar agora e os autores devem ser levados à justiça. O Governo de Moçambique tem de recuar para evitar mais violações dos direitos humanos", considera Khanyo Farise.
Notícia atualizada às 10h04
