No Parque Nacional da Gorongosa, os elefantes estiveram perto da extinção, para sobreviverem perderam as presas. Era preciso escapar à caça ilegal.
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Durante os anos da guerra civil em Moçambique, tanto o exército nacional como a Renamo, mataram quase dois mil elefantes para venderem o marfim e comprarem armas. A pressão da caça ilegal foi de tal forma intensa que a espécie, no Parque da Gorongosa, passou de 2500 para 250 animais.
Foi nessa fase que o número de elefantes sem presas começou a multiplicar-se. Uma equipa de cientistas norte americanos, juntamente com o Parque Nacional e com a organização ElephantVoices, descobriram como e porquê se deu essa evolução.
Ryan Long, professor de ciências da vida selvagem na Universidade de Idaho, explicou à TSF que "normalmente as presas são algo positivo. Os elefantes usam-nas para marcar e tirar a casca das árvores, procurar água, derrubar obstáculos e para as interações sociais. A seleção natural devia, por isso, favorecer os animais com presas. Neste caso e por causa da caça ilegal as presas acabaram por se transformar em algo negativo. Os animais sem presas tinham cinco vezes mais hipóteses de sobreviver."
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A equipa de cientistas foi à procura da origem da evolução e quis saber porque é que só as fêmeas apresentavam essa mudança. "A mutação responsável pelo nascimento sem presas foi encontrada no cromossoma X. É claro que as fêmeas têm dois cromossomas X, ou seja, têm um normal e outro que inclui a alteração. Quando têm crias vão passar um desses cromossomas."
É aí que a diferença se faz diz Ryan Long, "se for uma fêmea e receber o cromossoma normal vai nascer com presas, se receber o que tem a mutação, ela nascerá viva, mas sem presas. Tudo muda com os machos. Eles têm uma hipótese de 50% de herdar o cromossoma com a mutação e se isso acontecer o elefante morre, é abortado. É isso que sabemos, que é letal para os machos, e é por isso que não existem machos sem presas a passear em Gorongosa."
A equipa ainda não conseguiu perceber porque é que a mutação mata os machos, isso fica para um estudo posterior.
Esta realidade faz com que no Parque estejam a nascer mais fêmeas do que machos, mas os investigadores não acreditam que isso venha a provocar um desequilíbrio de género. A taxa de natalidade dos machos só baixa 25% e, como Ryan Long explicou, as fêmeas têm um papel muito mais importante na recuperação da espécie do que os machos.
Os 3 cientistas norte americanos que descobriram a mutação responsável pela perda das presas continuam agora o estudo. O professor de ciências da vida selvagem na universidade de Idaho diz quer querem tentar perceber como é que as fêmeas se adaptaram a uma vida sem presas. "Colocámos GPS nos elefantes com presas e sem elas e estamos a ver como se movimentam, os habitats que escolhem, a dieta que adotaram. Queremos saber como estas fêmeas se adaptaram a uma vida sem presas. É óbvio que se adaptaram porque parecem estar muito bem, mas como não têm presas tiveram de alterar alguns comportamentos habituais."
A descoberta da mutação responsável pelo nascimento sem presas foi apenas a primeira parte do estudo. Ryan Long admite que há muito que ainda não sabem e é por isso que os trabalhos vão continuar, "para além da morte dos machos, há por exemplo, algumas fêmeas que só têm uma presa e isso parece indicar que há um efeito intermédio que ainda não entendemos. E como é que esta mutação, ou a interação de outros genes podem afetar o tamanho das presas? São tudo respostas que procuramos."