Português condenado a cinco anos de prisão por incitação à subversão em Hong Kong
Em declarações à TSF, Isabel Santos, eurodeputada socialista e uma das vozes que mais defendeu Joseph John e criticou a lei de segurança nacional de Hong Kong, considera esta uma pena "imoderada, imoral e inaceitável".
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A justiça de Hong Kong condenou esta quinta-feira o português Joseph John a cinco anos de prisão pelo crime de incitação à subversão, no primeiro caso de segurança nacional a envolver um arguido com dupla nacionalidade.
No tribunal do distrito de Wanchai, o juiz Ernest Lin Kam Hung considerou que Joseph John fez parte de "uma perigosa conspiração" para "separar Hong Kong da China" e "mudar de forma violenta o regime político" da cidade.
Ainda assim, o juiz condenou Joseph John à pena mínima por incitação à subversão, um crime cuja pena máxima é de 10 anos, porque o português cooperou com a polícia ao partilhar a palavra-passe do telemóvel.
Em declarações à TSF, Isabel Santos, eurodeputada socialista e uma das vozes que mais defendeu Joseph John e criticou a lei de segurança nacional de Hong Kong, afirma que esta decisão abre a porta a outras condenações que violam os direitos humanos.
"Joseph John é cidadão com dupla nacionalidade portuguesa e europeia e foi a primeira vítima desta lei. A partir de agora há todo um caminho que se abre e nós sabíamos que havia todo um caminho aberto, até porque a China não reconhece a dupla nacionalidade. É uma violação dos direitos humanos, sem dúvida nenhuma", assegura.
Isabel Santos espera agora ouvir uma palavra do Governo português contra uma decisão que considera inaceitável. "A pena em si é absolutamente imoderada, imoral e inaceitável. Espero que alguém em Portugal erga a voz e espero não continuar a ser a única a falar neste caso. Gostaria de ouvir uma palavra do Ministério dos Negócios Estrangeiros", diz.
Pedro Neto, diretor executivo da Amnistia Internacional em Portugal, considera que o Governo português devia pedir esclarecimentos e rever acordos de extradição com Hong Kong. "É altura de Portugal rever quaisquer acordos de extradição que tenha com esta realidade para proteger as pessoas que estão cá, as suas famílias e também, neste caso, as pessoas que tenham nacionalidade portuguesa e que estão lá. É claro que a justiça de cada país é soberana. No entanto, perguntar não ofende e, portanto, a diplomacia, pelo menos, devia pedir alguns esclarecimentos sobre este caso uma vez que se trata de um cidadão português", afirma, em declarações à TSF.
A decisão da justiça de Hong Kong vem no seguimento de um apertar da democracia.Pedro Neto receia que a situação se agrave no território. "Esta é uma decisão para prender a democracia. A justiça também já há algum tempo que está a ser, de algum modo, instrumentalizada por questões políticas e é o que vemos aqui. Não são ambientes fáceis os que se vivem em Hong Kong e é, desde logo, um agravamento. É uma tendência dos tempos que já temos vindo a observar e que, infelizmente, parece que continuará, porque nada parece estar a reverter este caminho."
Joseph John está detido desde o final de outubro de 2022 e, após a leitura da sentença, a defesa confirmou à Lusa que o período de prisão preventiva irá ser incluído no cumprimento da pena, pelo que o arguido poderá sair em liberdade no final de 2027.
A acusação tinha pedido uma pena mais pesada, recordando que o funcionário do Royal College of Music, no Reino Unido, voltou para visitar a mãe, que estava doente, e não para se entregar, tendo usado o passaporte português, em vez do cartão de residente permanente de Hong Kong, para não ser detetado.
O juiz sublinhou que no passaporte de Joseph John, nascido em Hong Kong, o local de nascimento aparece como sendo no Reino Unido, e levantou a possibilidade de o arguido ter mentido às autoridades portuguesas.
Entre julho de 2020 e novembro de 2022, Joseph John fez 42 publicações nos perfis em redes sociais e na página da Internet do Partido para a Independência de Hong Kong (HKIP, na sigla em inglês), dos quais era um dos administradores.
A organização foi fundada no Reino Unido em 2015, mas a comissão eleitoral britânica revogou o estatuto de partido político em 2018.
Nas publicações, Joseph John lançou "uma campanha de angariação de fundos para despesas militares", referiu a acusação.
O arguido pediu a Londres para declarar que a China estaria a "ocupar ilegalmente" Hong Kong, assim como apelou ao Reino Unido e aos Estados Unidos para enviarem tropas para a antiga colónia britânica, cujo controlo passou para Pequim em 1997.
Joseph John defendeu também "uma invasão" da cidade vizinha de Shenzhen, para libertar 12 ativistas pró-democracia de Hong Kong, acusados de "travessia ilegal" das águas da China continental, grupo que incluía Kok Tsz-Lun, com dupla nacionalidade portuguesa e chinesa.
O juiz disse hoje que as publicações "não foram um mero exercício da liberdade de expressão, mas assim um apelo a ações criminais", que podiam ter convencido os mil seguidores do HKIP nas redes sociais "que o movimento independentista de Hong Kong tinha apoio do exterior".
Ernest Lin é um dos juízes nomeados pelo governo de Hong Kong para lidar com casos ligados à lei de segurança nacional promulgada em 2020 por Pequim, para pôr fim à dissidência na região semiautónoma chinesa.
Na sessão de hoje esteve presente o cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong, Alexandre Leitão, e um representante da Delegação da União Europeia em Hong Kong.
Joseph John, também conhecido como Wong Kin Chung, terá pedido um salvo-conduto para deslocação ao interior da China.
A China não reconhece a dupla nacionalidade e só atribui o salvo-conduto a pessoas de etnia chinesa, considerando que este documento serve como reconhecimento da nacionalidade chinesa.
Notícia atualizada às 10h11
