Prigozhin: do golpe ao chefe até à presumível morte do chef foram apenas dois meses
Para muitos russos foi um herói, para muitos mais no mundo foi um homem impiedoso e sem escrúpulos. Enriqueceu à custa de Putin e morreu dois meses exatos após o ter tentado derrubar.
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De chef de cozinha de Putin até tentar servir-lhe um prato de golpe de estado, Yevgeny V. Prigozhin fez de tudo um pouco... mas sempre à sombra do homem que manda no Kremlin há mais de vinte anos. E pouco tempo de vida teve (na verdade, dois meses exatos) depois de o ter tentado derrubar, a 23 de junho, acabando a vida num avião alegadamente abatido por sistemas de defesa do país que jurava defender, a 23 de agosto.
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A presença de Yevgeny Prigozhin neste avião foi confirmada pela Agência Federal para o Transporte Aéreo da Rússia (Rosaviatsiya), citada pela agência noticiosa oficial russa TASS. "Foi iniciada uma investigação sobre o acidente com o avião da Embraer que ocorreu esta noite na região de Tver. De acordo com a lista de passageiros, o nome e o apelido de Yevgeny Prigozhin estavam incluídos nesta lista", afirma a Rosaviatsiya.
Nascido em 1961, quando São Petersburgo se chamava Leninegrado, Prigozhin foi preso aos 20 anos de idade por roubo e outros crimes. Depois de cumprir uma pena de nove anos, abriu uma pequena loja de cachorros, o que o levou a uma carreira empresarial, abrindo mais tarde restaurantes e lojas de conveniência.
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Ficou rico graças aos laços pessoais com o presidente russo, conseguindo contratos de catering - serviços na área da alimentação - e de construção civil com o governo altamente lucrativos; enquanto isso foi construindo um grupo de segurança, uma força de mercenários, chamada Wagner.
Foi dono de um museu do chocolate em São Petersburgo, mas também de uma mina de ouro na República Centro-Africana, além de vários empreendimentos de petróleo e gás ao largo da costa síria. Através de uma vasta rede de empresas de fachada e intermediários, as actividades de Prigozhin incluem a restauração, a produção de filmes de ação, o fabrico de cerveja e vodka, o setor madeireiro, a extração de diamantes.
Já com a Crimeia ocupada há um par de anos e os mercenários Wagner a semearem o terror no Donbass, na Síria e em África, os EUA impuseram sanções contra Prigozhin em dezembro de 2016.
Em fevereiro de 2018, Prigozhin foi um dos 13 russos indiciados por um grande júri federal por interferir nas eleições americanas através da Internet Research Agency, uma fábrica de trolls que disseminou mentiras, as chamadas fake news e fez guerra de informação contra a América, em apoio à campanha presidencial de Donald Trump.
Após a invasão russa da Ucrânia, as fileiras do grupo de Prigozhin aumentavam com recrutas prisioneiros, que foi buscar passando por cima de ministério do interior e administrações prisionais e governadores regionais.
Em Moscovo, teve críticas, com analistas a expressarem dúvidas sobre o recrutamento de prisioneiros e sobre a luz verde que Prigozhin deu a várias execuções extrajudiciais.
A guerra trouxe-o ao palco mediático e deu-lhe estatuto de ator político com poder, utilizando as redes sociais para tornar o discurso duro e a brutalidade como marcas pessoais. Muito mais vezes contra os conterrâneos embora adversários nos círculos de poder de Moscovo do que propriamente contra o inimigo ucraniano.
Lançou acusações contra a liderança militar russa, acusando o ministro da defesa Sergei Shoigu e o general Valeri Gerassimov, comandante da chamada operação militar especial, de não fornecerem munições suficientes ao Grupo Wagner e de ignorarem a luta e o sangue dos soldados russos.
Demonstrando lealdade a ninguém mais do que Putin, Prigozhin tornou-se um símbolo da Rússia em tempo de guerra: impiedoso, desavergonhado na retórica e sem lei.
Terá sido essa sensação de impunidade que o levou a embarcar na aventura de derrubar o regime do homem que lhe estendeu o tapete para fazer fortuna. O que resultou da tentativa de golpe de 23 de junho, que muitos no ocidente chegaram a antecipar como marcha triunfal sobre Moscovo, não passou, na verdade, de um golpe rapidamente abortado, seguido de um exílio breve na Bielorrússia, uma aparição em África e um fim abrupto; uma morte rápida na queda de um avião, sem o sofrimento prolongado que, em vida, Prigozhin infligiu a milhares de famílias em vários continentes.
