Passaram 15 anos desde aquele que foi considerado o pior atentado terrorista em solo europeu, mas há marcas que o tempo não apaga. A presidente honorária da Associação de Vítimas de Terrorismo lembra o dia em que perdeu a filha.
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Faltavam 21 minutos para as oito da manhã quando três bombas explodiram num comboio que chegava à estação de Atocha, em Madrid. Ao mesmo tempo, outras sete rebentaram noutras estações da capital espanhola. Naquele 11 de março de 2004, Espanha acordava com o pior atentado terrorista de sempre na Europa, que deixou 192 mortos, 1.800 feridos e outras tantas vidas marcadas para sempre.
"Assassinaram a minha filha com 25 anos. E quinze anos depois, lembro-me de cada minuto desde as 7h39 horas desse dia. E a dor não se suaviza, continuas a perguntar porquê e para quê", conta Ángeles Pedraza, a presidente honorária da Associação de Vítimas de Terrorismo.
Ángeles Pedraza perdeu a filha, Miriam, naquele atentado. Como em todas as manhãs, Miriam apanhou o comboio para chegar ao trabalho. Devia ir com o irmão, mas naquele dia foi sozinha. "Iam juntos todos os dias, mas nessa manhã o meu filho adormeceu, e a a minha filha foi sozinha. Apanhou o comboio e, menos de dois minutos depois, a bomba rebentou".
A partir desse momento, começaram os telefonemas. Primeiro para a filha, sem obter resposta ao outro lado, depois para os hospitais, já consciente de que a filha seria uma das vítimas, mas sem pensar ainda no pior. Com o passar das horas, dirigiu-se ao IFEMA, o centro de exposições e congressos de Madrid, transformado num tanatório improvisado. "Lembro-me de um senhor que subia a uma mesa com um megafone, e chamava as famílias à medida que iam identificando os corpos."
A partir daí, Ángeles lembra, sobretudo, o silêncio do dia. "Madrid, uma cidade cheia de gente, cheia de trânsito e engarrafamentos, ficou em silêncio a partir do atentado. Ninguém falava, os carros não apitavam, não se ouvia nada", recorda.
Hoje, no Dia Europeu das Vítimas do Terrorismo, o silêncio desse dia foi substituído pelos atos de homenagem dedicados à memória dos que morreram. "Eu estou muito grata por este dia. Já não me podem devolver a minha filha, mas se todos seguimos em frente e nos esquecemos de tudo e não há homenagens, para que é que serviram tantas vidas?"
Num país que conviveu durante muitos anos com o terrorismo, devido aos atentados do grupo terrorista ETA, o 11 de março marcou também uma mudança no padrão das vítimas. "Com os atentados da ETA os espanhóis pensavam que só matavam polícias, guardas civis e militares. Nestes comboios iam pessoas de todas as profissões e de todas as nacionalidades. Nesse dia o mundo todo estremeceu porque percebemos que isto podia acontecer a qualquer um."
Apesar das marcas deixadas pelo terrorismo, a sociedade espanhola tenta cicatrizar as feridas e não viver com medo de que algo parecido possa voltar a acontecer. "Desde que a ETA deixou de matar ficou tudo mais tranquilo, mas mesmo que não vivamos com esse temor, de cada vez que acontece alguma coisa como os atentados de Barcelona em 2017, volta a aparecer o medo."
Quinze anos depois, Ángeles reconhece que o tempo ajuda, mas nada volta a ser normal: "Pode-se continuar a viver e a respirar... mas já de outra forma. A normalidade nunca mais regressa à tua vida."