Reserva de crise agrícola: "É muito difícil ser ativada e, quando é ativada, normalmente é insuficiente"
Paulo Nascimento Cabral defende o reforço das verbas e a flexibilização de regras para a ajuda europeia às crises agrícolas resultantes da seca
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O eurodeputado Paulo Nascimento Cabral (PSD) alerta para a rigidez das regras europeias para mobilizar a ajuda europeia para mitigar os impactos da seca na agricultura. Ouvido em Bruxelas pela TSF, o eurodeputado diz esperar que no próximo Quadro Financeiro Plurianual haja um volume orçamental adaptado às crises atuais, como a seca.
“Esperamos que, na próxima revisão da Política Agrícola Comum, a reserva de crise seja efetivamente melhorada e sejam até corrigidos alguns mecanismos de ativação”, defendeu o eurodeputado, considerando que também tem de haver melhorias no Fundo de Solidariedade.
“O Fundo de Solidariedade tem de ser revisto, tem de ser melhorado, aumentando a sua dotação, porque é insuficiente e, ao mesmo tempo, também flexibilizada a sua utilização”, sublinha o eurodeputado, lamentando que “a definição de crise, tragédia e emergência para a Comissão Europeia não seja necessariamente aquilo que as pessoas sentem no dia a dia”.
Já para a Comissão Europeia, “tem de se preencher uma série de requisitos que depois também não faz sentido”, tendo em conta que, para os afetados, crises como o impacto agrícola da escassez de água “são efetivamente uma emergência”.
O eurodeputado considera que os mecanismos europeus para lidar com as consequências da escassez de água não estão adaptados aos problemas dos dias de hoje. Uma das razões apontadas pelo eurodeputado Paulo Nascimento Cabral prende-se com as normas para a mobilização da reserva de crise para a agricultura.
“É muito difícil ser ativada e, quando é ativada, normalmente é insuficiente, [pois] estamos a falar de à volta de 400 milhões de euros anuais, o que para toda a União Europeia é manifestamente insuficiente”, lamentou, defendendo que, perante o problema, “a União Europeia tem de fazer mais e mais rápido”.
Por outro lado, alerta também para as ineficiências crónicas presentes no sistema de gestão dos recursos hídricos, havendo “estudos que mostram que há muita água que se perde e que corre diretamente para o mar (...) e que há muita água que se perde nas redes de distribuição”.
Assim, considera que “há um grande trabalho ainda a fazer na sensibilização e pedagogia de investimentos estruturais em determinadas áreas, que permitam, desde logo, uma melhoria na poupança e na eficiência do uso de água”.
O eurodeputado defende que a produção agrícola também deve adaptar-se à realidade da escassez de água, com novas técnicas para tornar mais eficaz a produção de alimentos.
“Uma das quais é o trabalho com novas espécies de propagação vegetal que permitam ser mais resilientes, por exemplo, à ausência de recursos hídricos”, sublinhou, lembrando que “há uma proposta que está em cima da mesa da Comissão sobre as novas técnicas genómicas, porém está parada no Conselho”. No entanto, o deputado considera que esta técnica seria uma possibilidade de “resposta para aquilo que é a ausência de recursos hídricos”.
“Outras coisas que nós podemos fazer é o setor agrícola também readaptar-se àquilo que é cada vez mais uma agricultura de precisão, ou seja, só a utilização da água necessária para aquilo que é a produção efetiva”, destacou, lembrando que há uma parte que está do lado do setor agrícola, mas também defende que deve haver investimentos diretos da União Europeia para suavizar o impacto orçamental de projetos direcionados para lidar com a escassez de água.
“Um investimento numa dessalinizadora, que está a acontecer agora no país, com o recurso ao PRR, em que há um financiamento praticamente integral. Estamos a falar de valores superiores a 100 milhões de euros, sendo incomportável para os Estados-Membros avançarem unilateralmente para este tipo de iniciativas”, sublinhou, considerando “muito necessário” que a Comissão Europeia “também dê resposta neste plano estratégico, do ponto de vista financeiro, para aquilo que são as questões estruturais dos Estados-Membros”.
A escassez de água na agricultura é o tema de uma conferência que vai juntar no Parlamento Europeu um conjunto de personalidades europeias que refletem sobre o tema e discutem possíveis soluções.
Quais as implicações da escassez de água na produção agrícola de alimentos e quais as vias alternativas para lidar com um problema crescente a nível europeu são pontos de partida para um debate que contará com a presença da ministra portuguesa do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho.
A iniciativa é organizada pelo deputado Paulo Nascimento Cabral, eleito pelos Açores nas listas do PSD. É membro da comissão de Agricultura. O eurodeputado defende uma agricultura adaptada à seca, mas considera que Bruxelas também deve ter instrumentos financeiros para a construção de infraestruturas para mitigar o problema.