Santos Silva lamenta envio de "arma bárbara" para Ucrânia e pede "cuidado" com estratégia "mais retórica do que prática" de Putin
Augusto Santos Silva, em declarações à TSF, sublinha que a Ucrânia é um dos países signatários do Tratado de Ottawa, que proíbe desde 1997 o uso de minas antipessoais e, por isso, lamenta a decisão que prevê uma quebra do acordo
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O antigo presidente da Assembleia da República Augusto Santos Silva classificou esta quarta-feira as minas antipessoais "uma arma bárbara" e lamentou a decisão dos EUA de enviar este arsenal para a Ucrânia. Sobre as alterações de Vladimir Putin à doutrina nuclear russa, o ex-governante considera que a estratégia do Presidente é "mais retórica do que prática", mas alerta que pode acabar por ter "consequências".
Foi anunciado esta quarta-feira que os EUA vão fornecer à Ucrânia "minas antipessoais não persistentes", para reforçar a defesa do país contra a invasão lançada pela Rússia.
O Tratado de Ottawa, no entanto, proíbe o uso de minas antipessoais. Este documento está em vigor desde 1997, com 160 países a ratificarem o acordo e, apesar de a Ucrânia ser um dos países signatários, tanto os EUA, como a Rússia e a China ficaram de fora. Já no ano passado, a Human Rights Watch denunciou o uso de minas por parte do Exército de Kiev.
Em declarações à TSF, o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros e anteriormente da Defesa Augusto Santos Silva classificou as minas antipessoais "uma arma absolutamente bárbara" e lamenta a quebra do acordo por parte da Ucrânia.
"A humanidade deu um grande passo em frente na maneira civilizada de se fazer a guerra - se é que há maneiras civilizadas de se fazer a guerra -, quando declarou a proibição do uso de minas antipessoais. É verdade que os EUA não assinaram essa declaração, mas a Ucrânia fê-lo. E todos os países, incluindo Portugal, que subscrevem a ideia de que as minas antipessoais são inaceitáveis como arma de guerra, só podem lamentar esta decisão dos EUA e da Ucrânia", defende.
Sobre as alterações à doutrina nuclear russa, assinada na terça-feira por Vladimir Putin, autorizando o uso alargado de armas nucleares, Augusto Santos Silva alerta que se trata de uma espécie de "bluff" perigoso.
"A Rússia vive uma fixação retórica: Putin quer-nos convencer de que é ele a vítima, quando é ele o agressor. Mais uma vez, o uso de armas nucleares é um passo que ninguém deve dar - a nenhum pretexto -, a não ser que seja atacado com armas nucleares", considera.
O documento "de planeamento estratégico" inclui a "posição oficial sobre a dissuasão nuclear", "define os perigos e ameaças militares contra os quais se pode atuar com dissuasão nuclear" e estabelece que um ataque nuclear por parte de Moscovo poderá ser considerado em resposta a "uma agressão contra a Rússia e os seus aliados por parte de qualquer Estado não nuclear apoiado por um Estado nuclear" ou a um ataque aéreo em grande escala com armas não nucleares, incluindo drones. "Entre as condições que justificam o uso de armas nucleares está o lançamento de mísseis balísticos contra a Rússia", lê-se.
O antigo ministro acredita, por isso, que a estratégia do Presidente russo é "mais retórica do que prática", mas deixa uma advertência: "Devemos ter muito cuidado, porque às vezes damos passos retóricos tão grandes que eles têm consequências práticas. A decisão de Putin deve ser criticada."