Alguns minutos após o encontro com Kim Jong-un, Donald Trump estava muito entusiasmado. "A nossa conversa foi honesta e produtiva", dizia o presidente dos EUA. Seis meses depois do histórico encontro em Singapura, apenas Trump se mantém otimista.
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O Presidente norte-americano continua a defender que a Cimeira de Singapura está a dar frutos. Em setembro, perante as Nações Unidas, lembrou que os mísseis já não voam de um lado para o outro, os testes nucleares pararam, os corpos de diversos soldados regressaram aos Estados Unidos e Pyongyang desmantelou algumas instalações militares.
As instalações, a que se refere Trump, foram uma base de testes nucleares, que tinha desabado durante o último ensaio, e um local de lançamento de mísseis, porque a Coreia do Norte tem outros. No início de dezembro, imagens de satélite divulgadas pela CNN mostraram que Pyongyang aumentou de forma significativa uma base de lançamento dos mísseis de longo alcance e revelaram a existência de uma outra.
A realidade mostra assim que a situação não é tão positiva como Donald Trump quer fazer crer. Kim Jong-un ainda não deu qualquer passo significativo no sentido da desnuclearização. É verdade que a Coreia do Norte suspendeu os testes nucleares em setembro do ano passado, mas os peritos americanos acreditam que o país continua a desenvolver os materiais necessários para produzir esse armamento. Neste momento Pyongyang possui entre 30 e 60 ogivas e pode ter mísseis balísticos com capacidade de atingir algumas zonas dos Estados Unidos.
Kim Jong-un recusa-se a entregar uma lista das armas nucleares, dos locais onde são produzidos os materiais que permitem a fusão e das bases onde estão estacionados os mísseis, argumentando que isso facilitaria uma lista de alvos, caso os americanos atacassem o país. O regime norte-coreano também ainda não permitiu a entrada de inspetores internacionais para visitarem as instalações militares.
Na prática, o líder coreano não está a violar qualquer entendimento porque o acordo assinado em Singapura é vago e fala apenas em construir uma paz duradoura e em avançar para a desnuclearização. Em termos práticos nada foi estipulado e, nas negociações que se seguiram, os norte-coreanos não se mostraram interessados em definir algo mais concreto. Os encontros previstos para o último mês foram cancelados por Pyongyang, que quer ver levantadas algumas sanções contra o país, alegando já ter feito um percurso para provar que está de boa fé.
Na administração norte americana há quem não esteja tão otimista como Trump. O conselheiro de Segurança Nacional já reconheceu que os progressos alcançados não são os esperados. John Bolton justificou mesmo os preparativos para uma segunda cimeira entre Kim e Trump devido à falta de resultados. Em entrevista ao Wall Street Journal, Bolton adiantou que o Presidente quer pôr o acordo em marcha e a cimeira deve realizar-se em janeiro ou fevereiro.
Os analistas esperam que, no segundo encontro, Donald Trump consiga resultados concretos porque de outra forma estará mais uma vez a dar legitimidade ao regime norte-coreano, conseguindo pouco em troca. Ouvido pelo New York Times, Evan S. Medeiros, diretor de politica asiática no Conselho Nacional de Segurança durante a presidência de Barak Obama, refere que "esta segunda cimeira desafia toda a lógica das negociações". Medeiros acrescenta que "ao encontrar-se com Kim, o presidente Trump só está a validar a estratégia da Coreia do Norte de o usar para ganhar tempo, aliviar as sanções e manter o país no caminho de se tornar de facto um estado nuclear."
Neste momento, a Coreia do Norte exige que antes de tornar a península livre de armas nucleares seja adotada uma declaração formal que acabe com o estado de guerra entre as coreias. Mas não só. Quer ainda o levantamento de algumas das sanções.
Os Estados Unidos deixaram cair a exigência de divulgação da lista de material e bases nucleares e acabaram com os exercícios militares com a Coreia do Sul. Washington conseguiu o regresso a casa dos corpos de alguns soldados que morreram na guerra das Coreias e a libertação de três americanos detidos pelo regime coreano.
Com a China e a Rússia a aliviarem as sanções, e com Trump a dizer que Pyongyang já não representa uma ameaça nuclear, é cada vez mais difícil forçar Kim Jong-un a avançar com a desnuclearização. Apenas o tempo está do lado dos americanos porque é pouco provável que um futuro presidente partilhe a abordagem conciliadora que Donald Trump tem com o regime dos Kim.