Trump quer desclassificar arquivos sobre assassínios de JFK e Luther King. Historiador fala em "encenação de transparência"
Em declarações à TSF, o historiador Manuel Loff tem dúvidas sobre se os documentos vão mesmo ser desclassificados, mas, se o forem, "pode trazer alguma surpresa"
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O Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ordenou na quinta-feira a desclassificação dos arquivos do Governo sobre os assassínios do ex-líder norte-americano John F. Kennedy em 1963 e do ativista dos direitos civis Martin Luther King Jr. em 1968.
"Tudo será revelado", declarou o Presidente norte-americano aos jornalistas ao assinar a ordem executiva na Sala Oval da Casa Branca.
Donald Trump, que tomou posse na segunda-feira, mandou também desclassificar os arquivos sobre o assassínio em 1968 do antigo procurador e senador Robert F. Kennedy, irmão do ex-Presidente dos Estados Unidos.
No seu primeiro mandato (2017-21), Trump ordenou a divulgação substancial dos registos do assassínio do ex-Presidente John F. Kennedy (1961-63), mas alguns foram retidos devido a preocupações levantadas pelos serviços de informações.
Ouvido pela TSF, o historiador Manuel Loff considera que é uma "encenação de transparência" por parte de Donald Trump, uma iniciativa que alimenta as teorias de conspiração do Presidente republicano.
"Ele em 2017 não revela tudo, mas é por opção dele e não propriamente desses serviços. Em 2017, historiadores, observadores, estudiosos disseram que duvidavam que qualquer coisa de muito substancial pudesse sair, vamos ver se desta vez sairá ou não, porque agora a atitude que ele assume é vir, no fundo, responsabilizar os serviços pelo facto de, em 2017, quando já era Presidente, não ter podido desclassificar a totalidade. Por um lado, há uma atitude de encenação de transparência e, ao mesmo tempo, responsabilização dos serviços naquilo que nós estamos a perceber que deve ocorrer, como já ocorreu na primeira Presidência de Trump, que são os choques muito frequentes com os serviços da Administração norte-americana", explica à TSF Manuel Loff.
O historiador tem dúvidas sobre se os documentos vão mesmo ser desclassificados, mas se o forem podemos ter surpresas. "Parece surpreendente que ele tenha avançado com um gesto desta natureza, que, a ser cumprido, pode trazer alguma surpresa. O assassinato do ex-Presidente dos Estados Unidos, o assassinato de Martin Luther King, o assassinato de Robert Kennedy só puderam ser perpetrados sem nunca terem sido resolvidos porque havia grandes cumplicidades dentro do sistema de poder nos Estados Unidos. Isto não é uma teoria da conspiração, já muita gente escreveu sobre isto com o mínimo de dados e só não podemos avançar mais porque a documentação não estava desclassificada", sublinha, defendendo que esta decisão de Trump dificilmente vai trazer a pacificação à sociedade norte-americana.
"Alimentando as teorias da conspiração, de forma alguma, trará qualquer forma de pacificação", assegura Manuel Loff. "Se pelo contrário, o que é muito improvável, permitisse uma investigação independente do mundo académico e do mundo jornalístico sobre aquilo que aconteceu nos anos 1960 e nomeadamente sobre estes três assassinatos que estão em causa, o efeito poderia ser positivo", assinala.
O historiador nota ainda que os problemas do presente "nunca serão solucionados se não forem atribuídas as responsabilidades devidas a quem criou os problemas no passado". "Esta é uma regra que todas as sociedades devem aprender. A transparência no presente só se sustenta sobre a transparência do passado. Eu gostaria muito que fosse efetivamente verdade que esta desclassificação permitiria fazer luz sobre aquilo que aconteceu nos anos 1960 na sociedade americana", acrescenta.
A ordem determina que o diretor nacional dos serviços de informação e o procurador-geral desenvolvam um plano para desclassificar os registos de John F. Kennedy no prazo de 15 dias, e de 45 para os outros dois casos, mas não ficou claro a data em que a informação será conhecida.
No final do passado mês de novembro, após a sua eleição para um segundo mandato na Casa Branca, Donald Trump repetiu a sua promessa de campanha de tornar públicos os últimos ficheiros classificados como "ultrassecretos" nos Arquivos Nacionais relativos ao assassínio de John Kennedy.
Após assinar a ordem, o líder republicano passou a caneta a um conselheiro e indicou que fosse entregue ao filho de Robert F. Kennedy, que tem o mesmo nome, e foi nomeado para liderar o Departamento de Saúde e os Serviços Humanos da nova administração norte-americana.
Robert F. Kennedy Jr. pede há muito tempo a libertação dos arquivos sobre a morte do pai.
A comissão oficial que investigou o homicídio do antigo Presidente dos Estados Unidos concluiu em 1964 que Lee Harvey Oswald, um antigo comando da Marinha que vivia na União Soviética, agiu sozinho, mas até hoje subsistem muitas incógnitas e especulações do que realmente aconteceu em 02 de novembro de 1963, quando Kennedy foi alvejado num cortejo nas ruas de Dallas.
Em dezembro de 2022, o Arquivo Nacional divulgou mais de 13.000 documentos, mas a administração do Presidente Joe Biden bloqueou a publicação de milhares de outros, alegando preocupações com a segurança nacional.
De acordo com o Arquivo Nacional, 99% da coleção está acessível desde então.
O irmão de John F. Kennedy, Robert Francis Kennedy, foi assassinado em Los Angeles em 05 de junho de 1968, quando estava numa posição favorável para vencer as primárias democratas para as presidenciais.
O senador democrata tinha acabado de terminar um discurso no Ambassador Hotel quando foi morto a tiro por um imigrante palestiniano nos Estados Unidos.
O líder dos direitos civis Martin Luther King Jr. foi assassinado em 04 de abril de 1968 por um segregacionista branco na varanda de um motel em Memphis, para onde se tinha deslocado em apoio a uma greve dos trabalhadores da limpeza pública que lutavam por melhores condições de trabalho.
