João Pedrosa decidiu ficar na cidade chinesa que foi o epicentro do novo coronavírus. Agora, escreve no site da TSF sobre o dia a dia em Wuhan.
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Está previsto para amanhã, dia 8 de abril, o levantar de mais algumas barreiras impostas a Wuhan quanto à circulação de pessoas e bens e, em especial, no que diz respeito às suas três estações de comboio e ao seu aeroporto.
Atualmente é-me apenas possível deslocar de onde resido para o meu local de trabalho e na zona circundante à minha residência.
Infelizmente ainda não vou poder, a curto prazo, visitar e conhecer pessoalmente o outro português de Wuhan, que também decidiu permanecer na cidade. O seu nome é Rui Severino.
Cheguei à China há pouco mais de um ano e ate à data do bloqueio, não sei por que razão, me convenci que eu era o único representante da nação portuguesa nesta imensa metrópole. O mais curioso é que o Rui tinha a mesma crença.
Estávamos os dois enganados, pois afinal existiam mais 16 almas lusas presentes neste canto do mundo no dia 23 de janeiro último. Nos dias seguintes ao bloqueio, e por via dos excelentes apoios e organização da embaixada de Portugal, foi na medida do possível conhecermo-nos um pouco. Foi criado um grupo no Wechat (app chinesa similar ao Whatsapp) de forma a facilitar o contacto e a partilha de informação entre todos.
Quando aconteceu a minha adesão a esse grupo, um pouco mais tardia do que outros, não tinha passado ainda nem um minuto e já o Rui estava a entrar em contacto comigo.
Talvez o facto da minha fotografia de perfil apresentar dois belos cavalos o tivesse impulsionado para uma rápida reação.
Muito compreensível, pois o Rui exerce aqui em Wuhan a bonita e nobre profissão de treinador de cavalos de corrida.
Nos dias seguintes partilhamos com os demais os momentos de incerteza e ansiedade sobre como e quando seria possível o regresso à pátria-mãe.
No dia de 2 fevereiro, os portugueses são finalmente resgatados.
O Rui e eu não partimos. Optámos por ficar. Os motivos de cada um talvez não sejam assim tão díspares, mas tenho a convicção pessoal de que o amor que o Rui nutre pela sua bela trupe de equídeos tenha sido a sua razão primeira.
De lá para cá, temos mantido o contacto próximo e trocado frequentemente telefonemas ou mensagens. Tenho acompanhado as suas preocupações com a saúde e alimentação dos seus magníficos atletas, durante estes dificílimos dias de tormenta, e do quanto o que ele tem feito para os manter felizes e nas melhores condições.
Dizem que os tempos difíceis trazem amigos. Acredito nisso.
Estou certo que em breve vou poder saudar pessoalmente o meu novo amigo: Rui Severino.
Por favor queiram aceitar um abraço de fé e esperança dos portugueses de Wuhan.
Não duvidem, esta guerra contra o devastador vírus vai ser ganha!
Mantenham-se seguros e saudáveis!
Joao Pedrosa, em Wuhan (7 de Abril de 2020)