Cerca de uma centena de pessoas cumpriu o quarto dia de vigília silenciosa em Luanda. O grupo exige a libertação de 15 detidos por alegada preparação de golpe de Estado. Entre os detidos está um jovem com dupla nacionalidade, portuguesa e angolana, há 21 dias em greve de fome.
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A manifestação deste domingo teve início às 18:00 (mesma hora em Lisboa) e às 19:30 reunia cerca de 100 pessoas, em protesto contra a detenção, desde 20 de junho, de um grupo de 17 ativistas (dois estão em liberdade), acusados de prepararem um golpe de Estado contra o Presidente José Eduardo dos Santos.
A concentração decorreu nas escadarias da igreja da Sagrada Família, em Luanda, perante um forte aparato policial, como constatou a Lusa no local, mas não se registaram quaisquer incidentes.
A agência Lusa conta que as mais de 100 pessoas que estavam em vigília decidiram desmobilizaram para evitar o choque com a polícia junto à igreja da Sagrada Família.
A desmobilização aconteceu pelas 20:30 (mesma hora em Lisboa) quando este grupo estava rodeado por dezenas de elementos da Polícia de Intervenção Rápida (PIR), incluindo um camião para lançamento de água já posicionado em frente - com as ruas envolventes cortadas ao trânsito automóvel - além de brigadas caninas, conforme a Lusa constatou no local, num ambiente de muita tensão.
Na altura, os participantes, em silêncio, envergavam peças de roupa branca, velas e cartazes com dizeres apelando à libertação dos 15 jovens - acusados de prepararem um golpe de Estado - e em solidariedade com o 'rapper' e ativista angolano Luaty Beirão, um desses detidos (desde 20 de junho) e que se encontra em greve de fome, há 21 dias.
A TSF ouviu Mónica Almeida, esposa de Luaty Beirão, que afirma que a polícia chegou pouco depois do início da vigília: "fomos surpreendidos por um forte aparato policial [...] temos tanques de água e temos brigadas caninas aqui em frente à igreja".
"Houve uma abordagem da polícia, da parte do comandante provincial da PIR, para desmobilizarmos. Após algum tempo tivemos que sair para evitar o choque, porque havia crianças e idosos na vigília", explicou no local à Lusa Pedro Pedrowski, ativista e um dos elementos que participava na vigília de hoje, a quarta consecutiva e a primeira a ser alvo deste aparato policial.
Entre os 15 detidos -- acusados a 16 de setembro de planear uma rebelião e um atentado contra o Presidente da República - encontra-se o ativista e músico Luaty Beirão, com dupla nacionalidade portuguesa e angolana, que cumpre hoje o 21.º dia de greve de fome por considerar a sua detenção ilegal.
Luaty Beirão é um dos rostos mais visíveis da contestação ao regime angolano e já chegou a ser preso pela polícia angolana em manifestações de protesto, desde 2011.
Engenheiro de 33 anos, Luaty Beirão está desde sexta-feira numa cadeia-hospital de São Paulo (Luanda), devido ao estado de saúde, já que, de acordo com a família, se encontra "em risco de vida".
Este domingo, a esposa de Luaty Beirão publicou uma mensagem no Facebook onde conta que esteve com o marido "está bem mais magro do que na passada terça-feira", a última vez que o tinha visto. A mulher conta que durante todo o periodo de detenção, 109 dias, "Luaty perdeu 20kg", cerca de 15 terão sido perdidos durante o periodo de greve de fome que começou há 21 dias.
Os familiares dizem ainda que as suas visitas a Luaty Beirão, na cadeia, onde se encontra desde 20 de junho, têm sido sujeitas a limitações, não previstas, pelos serviços prisionais.
No sábado, a televisão pública angolana começou a difundir, nos espaços noticiosos, imagens do ativista, na prisão, apresentadas como "exclusivo" e "desmentindo" rumores sobre a morte do jovem.
Luaty Beirão, que assina ainda com os heterónimos musicais "Brigadeiro Mata Frakuzx" ou, mais recentemente, "Ikonoklasta", aparenta um estado de saúde débil e surge recusando-se a prestar declarações àquele órgão público.
A Lusa noticiou, na segunda-feira, o conteúdo do despacho de acusação proferido pelo Ministério Público angolano contra os 15 jovens, alegando que preparavam uma rebelião e um atentado contra o Presidente da República, prevendo barricadas nas ruas e desobediência civil, que estes aprendiam num curso de formação.
"Os arguidos planeavam, após a destituição dos órgãos de soberania legitimamente instituídos, formar o que denominaram 'Governo de Salvação Nacional' e elaborar uma 'nova Constituição'", lê-se na acusação, deduzida três meses depois das detenções.
Os jovens negam a gravidade destas acusações, afirmando que se reuniam para discutir política.