Reportagem TSF. Visto da Moldova, Portugal é já ali para quem conseguiu escapar à guerra
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São muitos os beliches que tomam conta de um armazém no centro de Chișinău, a capital da Moldova. Um pequeno frigorífico aninha-se no canto da cozinha improvisada, assim com uma pequena mesa completa. Uma árvore de Natal decorada lembra a época festiva a quem, apesar de mais longe da guerra, ainda a tem demasiado presente.
As dezenas de camas servem outros tantos refugiados. Há jovens e velhos. Homens, mulheres e crianças que ali dormem, brincam e vivem enquanto esperam um novo rumo. Entre eles está Lina Yurkova, professora do Ensino Secundário que, até há poucos meses, morava sozinha nos arredores de Kiev.
Sozinha, porque o marido foi para a frente de batalha. Conta à TSF que tudo aconteceu relativamente rápido. Ele esperou "um, dois, três dias e foi embora".
"Como não temos filhos, disse-me: tu ficas e eu vou", recorda. Foi e ficou. Dez meses. Agora, Lina tem em Portugal o seu próximo destino.
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Não sabe porque escolheu o país como terreno para dar o próximo passo, mas sabe que não vai poder continuar a dar aulas de Matemática: "Acho que não é possível, não falo a língua."
Ainda assim, não baixa os braços. "Posso trabalhar em qualquer coisa", garante, "para pagar um hostel ou quarto".
Viktor Vishnyakov, um cozinheiro de 35 anos, tem a mesma vontade. Quer arranjar um trabalho que lhe permita alimentar a mulher e os quatro filhos, a mais nova deles com pouco mais de dois meses de vida.
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"Quando começou a ocupação, a minha mulher estava grávida de poucas semanas e, por isso, os russos deixaram-nos ir para Kiev. Depois, foi tratar da documentação e fugir", recorda. Olga, a mulher de Viktor, deixou na zona ocupada de Kherson a mãe e a avó.
Se tudo correr bem, e porque lá têm amigos, Sintra será a nova casa desta família. Mas, de olhos postos no futuro, Viktor já se concentra em Portugal: depois de falar com a TSF, aproveitou para fazer perguntas e saber mais sobre o ensino e o sistema nacional de saúde.
Lina, Viktor, Olga e tantos outros foram acolhidos neste armazém, em Chișinău, pelo congresso dos ucranianos na Moldova, uma associação que já ajudou mais de 10 mil pessoas desde o início da guerra na Ucrânia.
Viajam para Portugal inseridos num grupo de mais de cem refugiados que chega a Lisboa esta quinta-feira. Nem todos fogem da guerra, porque muitos já vieram de zonas libertadas pelas forças de Kiev. Querem, sim, deixar para trás a precariedade, a falta de água, de eletricidade e de aquecimento.
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Nos vários centros de refugiados visitados pela TSF há sobretudo mulheres e crianças - os homens com menos de três filhos dificilmente saem da Ucrânia - para quem o conforto ou a privacidade não são prioridades. Perante o trauma que deixam para trás, um pouco de calor na hora de dormir já basta.
Na Moldova, um país com pouco mais de 2,5 milhões de habitantes, há perto de 80 mil refugiados ucranianos.
*com Gonçalo Teles
