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Daniel Oliveira refere que o Observatório Português dos Sistemas de Saúde fez um balanço globalmente negativo da forma como o Estado lidou com a pandemia, mas considera que os problemas apontados não surgiram com a Covid-19, são sim estruturais.
"A pandemia mostrou que é necessário investir mais no Serviço Nacional de Saúde, melhorar a sua organização, motivar os seus profissionais, sobretudo os mais jovens, centrar a oferta dos cuidados mais nas necessidades de quem usa o serviço do que de quem o presta e que temos uma falta estrutural de planeamento. É um problema nacional antigo que resulta da fragilidade das nossas instituições e, num ambiente mediático, onde se vive apaixonadamente cada caso de cada dia, se legisla para responder a esse caso e se despreza tudo o que dure mais do que uma semana, não se devem esperar milagres", explica.
Para o jornalista, a decisão de fechar escolas no Algarve, "sem qualquer lei que o legitime" e "avisando os pais na véspera" é só mais um "episódio da nossa velha cultura do improviso".
No entanto, Daniel Oliveira considera que o assunto "mais sumarento" do relatório foi "a cacofonia das autoridades e responsáveis políticos" que, na opinião do jornalista, têm tido "discursos contraditórios e confusos".
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"Não me incomoda que o Presidente da República e o primeiro-ministro tenham entendimentos diferentes da fase da pandemia em que nos encontramos e não me parece que venha daí grande descoordenação, desde que não se peça às pessoas para fazerem coisas contraditórias. O que não pode acontecer é o que vimos com o presidente da Assembleia da República porque isso cria confusão nas pessoas", afirma Daniel Oliveira.
O facto de não existir um discurso técnico e científico unificado contribui, segundo Daniel Oliveira, para esta cacofonia. Mas o jornalista não pede que os cientistas se entendam e defende mesmo que a divergência faz parte da construção de consensos científicos.
"São, eles próprios, sempre provisórios, mas para as autoridades teria de existir um discurso organizado e, se não se conseguem plenários no Infarmed, ter-se-ia conseguido com um gabinete de apoio técnico pluridisciplinar capaz de produzir relatórios e recomendações para sustentar as decisões do Governo. Nunca foi esse o caminho e este relatório também sublinha esta falha grave, talvez por ser feito por pessoas da área da saúde é menos severo com os próprios especialistas", ressalva o jornalista.
Daniel Oliveira defende que os especialistas deviam procurar formação em comunicação de ciência, pois todo o discurso que incentive a população a não tomar a vacina "é irresponsável".
"Falar e comunicar são coisas diferentes. Comunicar sobre ciência no meio de uma crise pandémica não é coisa para amadores. Por isso, e pelo mesmo respeito pelo conhecimento que, justamente, exigem para com a ciência que dominam, os especialistas têm duas possibilidades, se quiserem ser responsáveis: falarem apenas para as autoridades ou procurarem aconselhamento junto de quem saiba de comunicação de ciência e de risco antes de se dirigirem à população. Isto, claro, se querem ajudar", acrescenta.
Texto: Cátia Carmo