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Esta semana ouviram-se discursos inflamados no Parlamento Europeu. A "fúria", a "desilusão", a "indignação" perante as buscas e detenções de suspeitos de corrupção que envolvia uma vice presidente da instituição. As suspeitas: a influência de posições e políticas do Parlamento Europeu a favor de um país terceiro, ao que tudo indica o Qatar.
É de louvar a indignação de agentes políticos ao mais alto nível no europeu. É de louvar todo o tipo de indignação perante o tráfico ilícito de influências, perante o lobby ilegal, perante o favorecimento ilícito e discriminatório. É de louvar a indignação perante a falta de transparência e perante os abusos de direitos humanos.
O que não deixo de questionar são os telhados de vidro. Os discursos disfarçados, que surgem como posicionamento de conveniência. E que surgem sobretudo pela pressão da opinião pública e mediática. A indignação costuma cessar quando cessa o assunto no palco mediático.
Hoje, reclama-se sobre os maus negócios com a Rússia; e os maus os negócios com o Catar.
Quanto a outros negócios, como com a China, silêncio.
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Em Portugal, em particular, o silêncio de quase toda a classe política governante perante os abusos de direitos humanos na China é ensurdecedor. Tudo em nome dos negócios.
Durante anos, o silêncio de quase toda a classe política governante perante os abusos de direitos humanos em Angola foi ensurdecedor.
E sobre mais países podemos falar: de Moçambique à Guiné-Bissau, da Turquia à Venezuela, passando por Israel e os Territórios Palestinianos Ocupados, e nunca esquecendo o Egipto e a Arábia Saudita, numa lista que não termina aqui.
Tudo em nome de bons negócios e boas relações com os governos destes países, apesar da sua opressão, dos seus abusos de direitos humanos e da usurpação de bens e recursos que pertencem a todos os cidadãos daqueles países, apesar da falta de democracia. Tudo em silêncio conivente.
É de louvar a indignação perante a falta de transparência, a corrupção e influências ilícitas.
Mas à política, aos decisores políticos, exige-se menos desfaçatez e mais ética. Mais valores e melhor trabalho por direitos humanos, por justiça social, por bem comum. Continuamos a subsidiar mais o consumo do gás e a subsidiar menos a investigação científica que nos dê alternativas.
É a incoerência que fere a confiança dos cidadãos na política. Precisamos de sinais claros e de indignação alargada perante os vários abusos de direitos humanos em várias partes do mundo, com as quais fazemos negócio, e os seus silêncios.
Precisamos de políticos, homens e mulheres, e políticas públicas que nos inspirem, que nos façam ver um mundo melhor.
