Corpo do artigo
Crispação. Recorda-se do termo? Pois bem, ele está de volta. A sociedade começa a emanar níveis de irritação estridentes através do megafone que é a comunicação social e as redes sociais. Os portugueses estão crispados, de novo, mas estão também profundamente desapontados. Tristes e dececionados com os dirigentes políticos e, nalgumas situações, com os líderes empresariais.
No primeiro caso, a culpa é da corrupção, da falta de ética, dos casos e casinhos no governo, de uma oposição que não é (ainda) alternativa e uma enorme falta de rumo para o país. Onde quer a nação estar daqui a 5 ou 10 anos? Ninguém sabe e a ausência de respostas é ensurdecedora. Por isso, as manifestações vão saindo à rua e começam a fazer parte do dia-a-dia.
TSF\audio\2023\01\noticias\22\22_janeiro_2023_a_opinao_rosalia_amorim
No segundo caso, os trabalhadores sentem que muitos patrões os deixaram à mercê de si próprios, sem boas condições de trabalho, sem benefícios ou regalias como prémios de desempenho e, simplesmente, sem aumentos salariais que lhes deem munições para enfrentar a inflação que devora os magros ordenados auferidos em Portugal. Onde querem as empresas chegar daqui a 5 ou 10 anos? Infelizmente, são cada vez menos aqueles que sabem responder. A justificação é sempre "a incerteza". Mas um projeto não se governa de incerteza em incerteza, mas de decisão em decisão, com consistência e objetivos claros e assumindo-os de forma transparente junto de todos, sem longas hesitações ou quando se empurra eternamente problemas com a barriga.
Por tudo isto e muito mais, que não cabe nestas linhas, o país voltou à crispação em 2023. O termo ganhou estrelato depois de, em 2011, ter chegado o PEC IV e a troika a Portugal, só saindo em maio de 2014. Um ano depois, nasceu a geringonça e, nessa altura, António Costa apelava "ao diálogo entre as diferentes forças políticas", considerando como um dos fatores mais negativos o ambiente de "crispação e de incomunicabilidade". Em 2016, quando Marcelo Rebelo de Sousa chegou à Presidência da República (foi eleito à primeira volta em 24 de janeiro de 2016, com 52% dos votos), declarou ser preciso descrispar a sociedade portuguesa e fez por isso. Usou a proximidade e os afetos para serenar os ânimos.
Em 2017, no âmbito de declarações sobre crispação e classe política, Marcelo usou a filosofia do Aikido, ou seja, "aproveitar a força de quem ataca para, com essa mesma força, canalizá-la para o imobilizar". Em 2023, o regresso da crispação pede, de novo, prudência e sapiência para sair de um labirinto que está a deixar o país sem Norte. Como na mitologia grega, saibamos desenrolar o novelo como fez Teseu - que, com fio condutor, conseguiu sair do labirinto do Minotauro.