"A Opinião" de Pedro Pita Barros, na Manhã TSF.
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Após alguns dias de alguma acalmia na discussão pública, a saúde voltou ao centro do debate político, com o anúncio pelo Bloco de Esquerda do fim das Parcerias Público-Privadas, com a inclusão desse princípio na nova lei de bases da saúde. O que significa, caso seja aprovada, que os Hospitais de Cascais, Vila- Franca de Xira e Loures passarão a ter gestão pública directa. Para o Hospital de Braga, essa opção foi já tomada a semana passada, quando o Governo decidiu que a passagem para gestão direta para o sector público será por vários anos.
Do ponto de vista político, deixarei para outros comentadores como interpretar o ser o Bloco de Esquerda a fazer este anúncio, mesmo que depois tenha gerado respostas do PCP e do PS a afirmarem que a discussão não se encontra ainda concluída.
Prefiro focar no que é a substância da decisão. As parcerias público-privadas são um contrato entre o sector público e o sector privado. São por isso um instrumento que as políticas públicas podem utilizar, se e quando for útil, e não um fim em si mesmo. Aliás, todos os hospitais neste modelo não deixam de ser hospitais do Serviço Nacional de Saúde, iguais a todos os outros do ponto de vista do cidadão.
As parcerias devem por isso ser avaliadas por se estão ou não a cumprir a sua missão. Ou seja, verificar se os objetivos assistenciais têm sido cumpridos, e se os contratos têm sido respeitados, nomeadamente nos custos para Serviço Nacional de Saúde.
Se as parcerias público-privadas dos hospitais estivessem a ser ruinosas para o SNS, era natural ver isso refletido nas propostas e documentos do Governo. Contudo, olhando para o Programa Nacional de Reformas, documento disponibilizado na semana que passou pelo Governo - a 15 de Abril de 2019 - e fácil de aceder no sítio de internet do Parlamento, não se encontra nada que permita concluir por resultados desastrosos dessas parcerias. É aliás dito nesse documento do Governo que, passo a citar "os relatórios sobre as parcerias público-privadas relativos aos hospitais de Braga e Cascais concluíram que houve uma efetiva transferência de riscos para os parceiros privados, que obtiveram uma rentabilidade económica bastante inferior à que projetaram, sem que daí adviessem quaisquer encargos adicionais para o Estado." (fim de citação).
Fica por isso a perplexidade de haver um acompanhamento pelo Governo com expressão pública de uma avaliação que não declara as parcerias como negativas para o SNS e uma discussão no Parlamento que as quer proibir. As duas situações parecem pertencer a dois mundos diferentes.
Colocar numa lei de bases a proibição das parcerias público-privadas não tem justificação a não ser por teimosia política, cujos custos só serão sentidos no futuro e provavelmente não por quem atualmente vai decidir no Parlamento.
Como tem sido dito por vários intervenientes no sector, a lei de bases deve abrir opções, que depois cada Governo, tendo o seu programa legitimado em eleições, poderá usar ou não. O permitir usar parcerias público-privados, ou contratos com o sector privado, pelo Serviço Nacional de Saúde, não obriga a que sejam usadas. Mas proibir obviamente impede-o, a menos que haja outra revisão da Lei de Bases (que poderia ser feita por outro Governo). Mas assim facilmente a Lei de Bases deixará de ser um documento orientador de longo prazo para ser mudada ao sabor de cada conjuntura política.
Veremos se nesta discussão acaba por predominar uma visão de sistema, uma visão de longo prazo, permitir as parcerias segundo a política de cada Governo, ou uma visão de ganhos políticos de curto prazo, com a sua proibição.
Citação completa do documento "Programa Nacional de Reformas":
"Neste âmbito, é de realçar que há um conjunto extenso de atividades levadas a cabo pelas ARS no acompanhamento permanente do desempenho das parcerias-público-privadas da Saúde, cabendo ao Ministério da Saúde concretizar a avaliação e acompanhamento desses contratos de modo a garantir o benefício para o Estado, em termos de economia, eficácia e eficiência, garantindo, simultaneamente, a qualidade do serviço prestado às populações. De notar que os relatórios sobre as parcerias público-privadas relativos aos hospitais de Braga e Cascais concluíram que houve uma efetiva transferência de riscos para os parceiros privados, que obtiveram uma rentabilidade económica bastante inferior à que projetaram, sem que daí adviessem quaisquer encargos adicionais para o Estado.
O autor não escreve segundo a grafia alterada pelo Acordo Ortográfico de 1990