O excedente externo está a melhorar. O défice a reduzir-se. O emprego a subir. E as previsões do PIB a cair. Estará o governo certo e a economia errada?
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Há um velho cliché no fim das relações que se podia aplicar ao governo e à economia portuguesa. "O problema não és tu, sou eu. Tu Governo, tens feito tudo bem. Repões rendimentos para me estimular, reduzes o défice para me sustentar, o desemprego está a cair, o excedente externo a melhorar, está tudo certo. Eu é que não cresço. Não é de agora, sempre fui assim. Nunca fui economia que crescesse muito". O diálogo imaginário é bem o retrato de um país que já andou para a frente e para trás demasiadas vezes.
Há duas coisas que tiram o atual Governo do sério: dizer-se que tem um modelo económico assente no consumo privado e que a economia não está a crescer o que era suposto. Ora, dá-se o caso de ambas serem verdade. Um Governo que quer, e bem, aumentar salários e pensões, repor rendimentos no mais curto espaço de tempo possível, aliviar os impostos sobre o trabalho, quer, naturalmente, deixar dinheiro disponível às famílias para que essas famílias possam consumir. Foi esse o pressuposto que esteve na origem do programa do Partido Socialista e, apesar de António Costa e Mário Centeno o negarem agora vezes sem conta, é esse o principal pressuposto da política económica desta maioria.
A segunda irritação do Governo tem a ver com o crescimento anémico da economia. Do cenário macroeconómico que Centeno desenhou antes de ser ministro até agora, o PIB já deu um trambolhão de mais de um ponto percentual. O investimento arrasta-se a passo de caracol e, ironia das ironias, até o consumo privado no próximo ano foi revisto em baixa. As coisas não estão a correr como era suposto e Mário Centeno sabe-o perfeitamente.
Chegamos então ao principal problema do país. A sustentabilidade das políticas. Em 2007 Portugal teve o défice mais baixo das últimas décadas. Em 2009 aumentaram-se os funcionários públicos. E em 2011 o país estava a pedir ajuda externa. Por redutor que isto possa parecer, a verdade é que o problema foi sempre o mesmo. A economia não cresceu o que devia e, quando a isso se soma uma dívida galopante e um investimento fraco e pouco reprodutivo, não há política que possa ser sustentável.
Mário Centeno apresentou o segundo Orçamento na sua curta história como Ministro das Finanças. Não é, seguramente, o Orçamento que gostaria de apresentar. É, como são todos, o Orçamento possível. Negociado, condicionado, amarrado a um conjunto de compromissos nacionais e internacionais, aprisionado a uma dívida monumental. É um Orçamento, como têm sido quase todos, feito quase numa lógica de caixa, de manta curta incapaz de tapar tudo o que destapa. É um Orçamento sem grande história. E como nós precisávamos de começar a construir uma nova história! A sustentabilidade desta política, deste Orçamento, não se mede pelo punhado de medidas que lá estão inscritas, mas pela capacidade deste Governo e dos partidos que o apoiam, de olharem para lá do óbvio, para lá dos 365 dias de um ano, para lá do amanhã.