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Seis concelhos não passaram para a nova fase de desconfinamento e quatro voltaram para trás. Os autarcas de Odemira, Moura, Rio Maior e Portimão "ficaram obviamente desagradados", já que "o recuo é um revés para as economias locais", diz Daniel Oliveira. Trata-se de "dezenas de empresas que se podiam salvar e irão falir, empregos que se perdem" e do "futuro adiado", mesmo que se saiba, "como disse a presidente da Câmara de Portimão" e parafraseia o jornalista, "[que] o vírus não está espalhado nas ruas, nas casas e nas esplanadas, mas em locais identificados e bem determinados".
A travagem no desconfinamento "é especialmente injusta nos concelhos com pouca população", reconhece o jornalista, no seu espaço habitual de Opinião na TSF. Em Rio Maior, há 33 casos ativos, menos 17 do que há duas semanas. "Basta um pequeno surto e tudo tem de fechar. Neste caso, um surto numa panificadora e outro, muito pequeno, numa creche."
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"Os autarcas, descontentes, dizem que o Governo devia estar mais atento aos pormenores e não aplicar cegamente uma matriz simples, que apenas tem em conta o índice de transmissibilidade e os novos casos da infeção por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias. Não tem outro remédio senão ser cego. Ou se fecha o país inteiro de cada vez que há sinais de recuo, ou optamos por aplicar o mesmo critério a todos os concelhos e tomar as medidas protocoladas." Daniel Oliveira explica que esta matriz é muito exigente e que Portugal teria passado muito mais tempo em confinamento se a tivesse aplicado no último ano. "Ela podia ser mais completa, mas nunca estaríamos todos de acordo quanto aos critérios que lá deveriam estar", alerta o cronista.
Não fossem os critérios objetivos e cegos, logo cairia sobre o Governo a suspeita de motivações políticas em cada decisão.
Daniel Oliveira assinala que "não há números mágicos, mas tem de haver regras previsíveis". Por isso, sustenta também, "a única forma de tomar esta decisão sem que se instale a suspeita da arbitrariedade é ter uma matriz compreensível que se aplica sem exceções, até porque estamos em ano de eleições autárquicas".
"Não fossem os critérios objetivos e cegos, logo cairia sobre o Governo a suspeita de motivações políticas em cada decisão", argumenta o jornalista. Daniel Oliveira vaticina que, "conhecendo os partidos e a capacidade de pressão dos autarcas, essa suspeita seria plausível".
Com um critério cego e inflexível, não há milagres, afirma. Haverá sempre injustiças. "O Governo decidiu, por exemplo, não aplicar às escolas esta regra local, não é difícil perceber por quê. Se a aplicasse, os alunos de regiões mais afetadas nunca poderiam ser avaliados com os mesmos critérios de outros, e a gestão de um sistema que é nacional seria um quebra-cabeças impossível."
Para que a matriz seja aceite, mesmo sabendo-se as suas fragilidades, as autoridades não podem falhar.
A educação foi, como aclara Daniel Oliveira, uma das atividades que permaneceu mais tempo confinada. "O Governo assumiu que é uma prioridade, fez bem." O efeito, aponta também o jornalista, é "as lojas de Rio Maior fecharem no mesmo dia em que a escola secundária abre". Quanto a isso, nada há a fazer, assume Daniel Oliveira. É esta decisão ou a arbitrariedade, "um terreno em que toda a gente ralha e ninguém tem razão".
"Para que a matriz seja aceite, mesmo sabendo-se as suas fragilidades, as autoridades não podem falhar." Para Daniel Oliveira, a correção à situação epidemiológica em Beja é algo que não deve repetir-se, principalmente sendo a cidade uma capital de distrito em que as consequências de atrasar o desconfinamento seriam grandiosas.
Temos de assumir que o confinamento deixará de fazer sentido como uma forma de conter a pandemia.
Em Odemira, a população permanente é de 40 mil pessoas, apesar de os números oficiais serem de 25 mil. "Se os imigrantes que trabalham nas estufas contam para os números da pandemia, têm de contar para a população. Além disso, trabalham em péssimas condições, sem que o Estado central os defenda dos riscos que correm." Por isso, frisa Daniel Oliveira, a injustiça ocorrida em Odemira tem que ver com "erro no cálculo da população real, e tem de ser corrigido".
"Por mais uns meses teremos de viver com decisões imperfeitas, numa realidade que não é normal, e, à medida que se for vacinando e protegendo os grupos de risco, temos de assumir que o confinamento deixará de fazer sentido como uma forma de conter a pandemia. Mesmo que alguns especialistas prefiram ignorar os efeitos que ele tem, imaginando que eternizá-lo não revela também alguma imprudência. A resposta terá de ser nos cuidados quotidianos. Por isso, a prioridade é vacinar, e seria excelente que as autoridades e a comunicação social não estivessem tão empenhadas na sabotagem deste processo criando um alarme absurdo em torno de riscos insignificantes."
* Texto redigido por Catarina Maldonado Vasconcelos