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É de elementar bom senso que um juiz não possa julgar um caso em que é arguido. É uma situação que não dá quaisquer garantias de equidistância e de justiça. Da mesma forma, o bom senso diz que se tiver um cargo de gestão pública não posso contratar uma empresa do qual sou sócio. No caso dos cargos políticos, nem se trata de bom senso mas mesmo de limitação legal. É proibido e alargado, também, aos familiares diretos.
Infelizmente, na Comissão Técnica Independente o bom senso não abunda e a opacidade é cada vez mais a regra.
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Já tinha dado nota das situações de falta de distanciamento que existiam nas tomadas de posição dos membros desta Comissão e da forma como os estudos necessários estavam a ser adjudicados diretamente às Universidades de origem dos membros da Comissão.
Mas o que tivemos conhecimento esta semana é de uma gravidade sem paralelo: uma vogal da Comissão Técnica Independente, é sócia e ex-administradora de uma empresa a quem foi atribuído um ajuste direto de mais de 200 mil euros.
A Comissão Técnica Independente veio defender-se, dizendo que vogal não está envolvida neste ajuste e que o seu grupo de trabalho não comunica com esta empresa. Não sei qual é a veracidade desta informação e muito sinceramente não a acho sequer relevante.
Em nenhuma circunstância este ajuste é aceitável, não respeita princípios de transparência e coloca completamente em causa a idoneidade de toda esta Comissão.
Para piorar a situação, nenhum destes contratos tinha sido publicado quer no Portal Base quer no site da Comissão. Mais uma situação que causa desconfiança e mina a credibilidade do processo.
A criação desta Comissão obedecia a duas premissas base: a primeira é que tinha de ser técnica, a segunda, que tinha de ser independente. Ambos os pressupostos estão postos em causa.
Não houve um único estudo atribuído a uma instituição internacional ou sequer levado a concurso. Foram todos adjudicados por ajuste direto e muitos a instituições com relação com os membros da Comissão Técnica Independente.
A credibilidade da Comissão Técnica Independente está posta em causa. Há desconfiança nos processos, nas adjudicações e nas metodologias.
A Comissão devia ser o bastião da objetividade técnica e da transparência, mas transformou-se num viveiro de casos, de desconfiança e de opacidade.
A confiança perdida é muito difícil de ser recuperada, porém é obrigação da Comissão Técnica Independente tomar medidas proativas para reafirmar a sua independência e restaurar a fé no seu trabalho.
Tem essa obrigação, não só para com este dossier, mas para com todos os futuros investimentos estratégicos que necessitarão de comissões similares e que não podem ter início com o manto da desconfiança herdada desta Comissão.
