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Não vale a pena tentar envenenar relações, criar conflitos ou confusões, muito menos predições, ou misturar alhos com bugalhos. Há duas mensagens que têm sido recorrentes no discurso do Presidente da República, condizentes com a ação.
Uma, apresentada no dia em que Marcelo Rebelo de Sousa anunciou a sua recandidatura. "Sou exatamente o mesmo que avançou há cinco anos". O mesmo que foi crítico nos momentos em que foi necessária maior assertividade presidencial; o mesmo, indiferentemente dos tempos de certeza ou de incerteza. Outra, na exigência permanente de não somar instabilidade política às crises pandémica e económica.
Os mais desatentos dirão que não houve, portanto, nas declarações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a necessidade de estabilidade política, novidade em relação ao que é o seu discurso habitual. Os recados dirigidos à Oposição e ao Governo são uma constante e a cooperação estratégica entre Belém e São Bento é para ele uma prioridade, fruto da visão que mantém sobre o que é o interesse do país.
Só mesmo a desatenção permitirá, contudo, deixar passar divergências com o primeiro-ministro. Desde logo, no foco total à vigilância sobre a aplicação dos fundos. Na mesma semana em que António Costa quis desconstruir a ideia de desperdício e má gestão, Marcelo dirigiu-se diretamente ao Tribunal de Contas para exigir vigilância absoluta.
Mas mais séria ainda é a ideia de que não aproveitámos como deveríamos as oportunidades que tivemos com sucessivos pacotes de fundos. "Nos próximos anos ou damos o salto que merecemos ou nos resignamos ao fado da perda desse futuro", afirmou o chefe de Estado.
E é essa ideia de ambição que coloca o Governo no olho do furacão. Ao mesmo tempo que pede estabilidade, Marcelo lembra que as opções tomadas e o caminho feito na aplicação da "bazuca" serão julgados pelos portugueses. A estabilidade poderia parecer um caminho fácil para Costa, de deixar fazer e passar. O que o presidente da República diz é cristalino: o Governo terá condições únicas para fazer. Ou faz, ou terá de ser responsabilizado por isso.
Mas é claro, diz o presidente, que "cabe aos que se opõem criar alternativa ou alternativas".