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A vitória no debate pôs Kamala na liderança da corrida, mas calma: tudo continua em aberto.
Sondagem ABC News/Ipsos dá 52% a Kamala Harris e 46% a Donald Trump nos votantes prováveis, naquele que foi o estudo com amostra mais representativa pós-debate da Pensilvânia. Aponta para um efeito de triunfo da democrata nesse duelo, mas com uma corrida ainda relativamente equilibrada. Kamala tem nove pontos de avanço nos independentes (53/44), onze pontos nas mulheres (55/44). Nos homens regista-se um empate: 49/49. Nos jovens até 30 anos, vantagem clara da democrata (59/40), ainda que muito sustentada no enorme avanço nas mulheres jovens: 68/30, uma vez que nos homens jovens regista-se quase um empate. 51/48 para Harris.
Nos temas, as coisas estão bem mais equilibradas. Trump lidera em dois tópicos essenciais, Economia e Imigração, ainda que não de forma esmagadora: 46/39 na Economia, 47/37 na Imigração. As vantagens de Kamala são no aborto (48/34) e na defesa da democracia (45/36). O senador Joe Manchin (Virgínia Ocidental), eleito pelos democratas, mas agora independente, por votar geralmente alinhado com os republicanos, apoia Kamala Harris.
Haverá, nos próximos 48 dias, um próximo acontecimento "major" que possa voltar a mudar o curso desta eleição? Até agora, pelo menos, não parece que a nova tentativa de atentado a Donald Trump tenha sido esse tal acontecimento disruptivo.
A Economia a dar sinais contraditórios
Deverá ser conhecida ainda hoje, quarta-feira, a decisão da Reserva Federal norte-americana quanto a uma mais que esperada descida nas taxas de juro. A questão está na dimensão da redução: 0,25 ou 0,50 pontos percentuais?
Tudo indica que será apenas o primeiro de vários cortes até meados do próximo ano, numa tendência que deverá passar os juros dos EUA dos atuais 5,25/5,5% para os 2,75 a 3% até ao final do primeiro semestre de 2025.
As taxas de juro estão num pico de duas décadas, numa política da FED que permitiu que a inflação baixasse em valores recorde nos últimos dois anos: dos 9,1% em 2022 para os atuais 2,5%.
Perante a descida mais rápida que o esperado da inflação, é tempo de os juros começarem a baixar. Jerome Powell, líder da FED, em recentes intervenções públicas, deixou clara a sua visão: a autoridade monetária norte-americana está preparada para, através da redução do nível das taxas de juro, apoiar o mercado de trabalho nos EUA e assegurar uma aterragem suave da economia.
Isto parecem ser boas notícias para Kamala Harris e para o final da Presidência Biden, que tanto sofreu em popularidade com a necessidade de tomar medidas para baixar a inflação criada pelo final da pandemia e pelo início da guerra na Ucrânia.
A grande questão é esta: será que os norte-americanos vão sentir, a tempo da eleição de 5 de novembro, que já têm mais dinheiro no bolso, com esta nova fase da Economia americana?
O tema económico, até agora, parece beneficiar Trump. Mesmo a sondagem ABC News/Ipsos, que dá seis pontos de avanço a Kamala sobre Trump nos votantes prováveis (52-46), coloca Donald sete pontos à frente na Economia 46-39. Mas, por outro lado, há alguns sinais de recuperação de Harris nesse ponto tão importante em eleições americanas. De acordo com estudo Financial Times/Michigan Ross, 44% dos votantes registados confiam mais na democrata para lidar com a economia, para 42% no republicano. Os eleitores consultados para a pesquisa ainda demonstraram acreditar que a democrata representa melhor os interesses da classe média, pequenas empresas, membros de sindicatos e trabalhadores “blue colar”. Trump, por outro lado, é visto como bom representante de grandes corporações e dos ricos. Estes dados são consonantes com outro estudo da Universidade do Michigan, que na semana passada identificou uma melhoria em dois pontos percentuais do sentimento dos americanos sobre a Economia, na sequência da descida da inflação para 2,5%.
Kamala e os homens negros
Kamala Harris admitiu estar a trabalhar para ganhar o voto do eleitorado masculino negro. Em entrevista de campanha a três jornalistas da Associação Nacional de Jornalistas Negros, a candidata democrata fez notar: "Acho que é muito importante não operar partindo da suposição de que os homens negros estão no bolso de alguém. Os homens negros são como qualquer outro grupo de eleitores. Tem de se ganhar o voto deles e estou a trabalhar para isso, não presumindo que vou tê-lo porque sou negra", acrescentou.
Os receios são fundados. Se os democratas mantêm um enorme avanço no voto negro em geral, as diferenças entre mulheres negras e homens negros são substanciais. As mulheres negras preferiram Hillary em 2016 e Biden em 2020 com percentagens acima dos 90%. Já os homens negros terão dado a Donald Trump cerca de 12% da preferência em 2016, perto de 20% em 2020. Antes da desistência de Biden, Trump teria perto de 35% do voto dos homens negros – algo que Kamala tenta agora reduzir substancialmente.
Depois há a questão da mobilização. Em estados como a Geórgia e a Carolina do Norte, as sondagens mostram que Kamala Harris tem uma hipótese real de vencer. Mas só se os homens negros forem mesmo às urnas concretizar a intenção de voto que estão a revelar nas sondagens. Isso aconteceu com Obama em 2008 em grande número, em 2012 (já não tanto), mas menos em 2016, o que foi comprometedor para Hillary.
De acordo com sondagem Pew Research Center, realizada entre 5 e 11 de agosto, um pouco antes da Convenção Democrata de Chicago, Kamala liderava Trump nos negros por 77-13 (73-16 nos homens negros e 79-10 nas mulheres negras).
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