Durante a pandemia, com cada um enfiado no seu quadrado e a ansiar pelo oxigénio dos espaços rurais, a ideia de viver no campo ganhou contornos idílicos e muito se especulou sobre a possibilidade de transição significativa de pessoas para o Interior. Terminados os períodos de confinamento, a maioria das pessoas voltou à rotina e os territórios de baixa densidade, que ocupam cerca de 80% do país, continuam a concentrar apenas 20% da população.
Houve, ainda assim, sementes lançadas nesse período que ficaram e vão dando frutos. É o caso da Rural Move, que nasceu oficialmente como associação em outubro de 2020 e acaba de conquistar o primeiro lugar do prémio Manuel António da Mota. Inicialmente corporizada numa plataforma destinada a ajudar quem quer instalar-se em territórios rurais, a associação foi desenvolvendo outras iniciativas de capacitação das comunidades, debates, experiências de trabalho remoto de curta duração, bem como interação com projetos idênticos a nível europeu.
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Há muitos motivos para que as populações no Interior se sintam abandonadas e esquecidas pelos vários poderes. Têm pouco peso na escolha do Parlamento e não faltam exemplos de promessas não cumpridas por sucessivos governos. A atividade da Rural Move revela, neste contexto, virtualidades que merecem ser mais divulgadas e replicadas à exaustão. Desde logo, faz a ponte entre quem está nos territórios e quem aspira a viver e investir neles, num modelo participativo e de baixo para cima que não depende de decisões longínquas dos centros clássicos de poder. Por outro lado, entre os rostos de coordenação e voluntários impera uma marca de juventude que desconstrói a ideia derrotista de que o envelhecimento é uma inevitabilidade no mundo rural.
Criou-se a ideia de que um jovem com ambição tem de aspirar a pelo menos uns anos de trabalho no estrangeiro. Quase como uma sentença a que o país, ao que parece sem futuro, estará condenado. Pelo contrário, a mudança é feita com quem acredita que a tecnologia e a mobilidade são armas para atingir a excelência em qualquer lugar. Não há ideia mais provinciana, em 2025, do que a de que apenas nas grandes cidades se vê a luz. Embora pareça tantas vezes fora de moda, a ideia de pertença, de criação em rede, de devolução à comunidade daquilo que ela investe em nós é, na verdade, bastante inovadora. O futuro foi sempre de quem ousou andar em sentido contrário no carreiro.
