Impressiona a falta de lucidez de quem compra uma guerra perdida, promete "montar barracas" em Lisboa e quer proibir quem inova. Os representantes dos taxistas nunca disseram: "queremos ser melhores".
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Era uma guerra perdida mas a Antral e a Federação Portuguesa do Táxi quiseram comprá-la. Queixaram-se - com razão formal - da falta de regulação de serviços como a Uber e a Cabify, que crescem em Portugal e em muitos países. Esse momento chegou, com a regulação destes novos negócios a acontecer em novembro.
Protestaram - e o mais irónico é que, em parte, mostraram nesses protestos porque é que, quem pode usa as novas plataformas eletrónicas. Violência, tensão, discursos agressivos e até ameaças de morte não são um bom cartão de visita. E não ajudam na tal guerra que de qualquer forma já estava perdida, mas que podia terminar com dignidade para os vencidos.
Correndo tudo com normalidade, a guerra chegou ao fim. Mas os taxistas ainda vão a tempo de lutar pela tal dignidade. Basta quererem ser melhores, prestar um serviço de maior qualidade, reabilitar a classe.
Deste lado do ecrã também está uma classe ameaçada pela tecnologia - mas, que eu saiba, ninguém disse que queria matar o Mark Zuckerberg ou agredir o Sundar Pichai. Ao contrário: estamos a adaptar-nos, a evoluir ao encontro daquilo que julgamos serem as exigências de um tempo novo. Nunca vi os representantes dos taxistas mostrarem intenção de fazer algo semelhante.
Há dias, os taxistas prometeram "montar barracas para acampar" em Lisboa no dia 10 de outubro, no maior protesto de sempre do sector. Será, no dizer do diplomático Florêncio Almeida, uma manifestação na qual a classe vai mostrar que não é um grupo de "arruaceiros". A promessa chega, claro, com o anexo habitual: "num movimento desta natureza, pode acontecer alguma coisa desagradável" que, se acontecer será, claro, da responsabilidade "do governo, que não cumpre a Constituição". Estamos conversados.
Impressiona que ao longo deste processo não tenhamos ouvido os representantes dos taxistas reconhecerem a mediocridade, obsolescência e incompetência de parte do sector. (Como sempre acontece quando se fala numa classe, paga o justo pelo pecador: há excelentes profissionais de táxi).
Impressiona que não tenham exigido ou sequer sugerido aos associados uma melhoria do serviço. Que não tenham reconhecido que é insustentável ignorar a evolução social e tecnológica que permite o sucesso das novas empresas. (Os pequenos sopros de tecnologia não chegam. É sobretudo a qualidade do serviço que tem de ser melhorada). Que tenham ignorado um número: 2016.