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É possível que muitas das nossas perceções sobre violência em contexto escolar sejam influenciadas pela amplificação de episódios filmados e lançados no espaço público. São cíclicas essas projeções na internet e um novo caso, com imagens nas redes sociais, mostra a agressão de que é vítima uma aluna de 11 anos, numa escola no Entroncamento. Segundo a mãe, os episódios de bullying serão recorrentes. O inquérito ao caso ainda decorre, mas o Ministério da Educação confirmou que todos os alunos envolvidos estão já com acompanhamento especializado.
Um caso com amplitude mediática não chega para medir o pulso à violência nas escolas. Até porque os comportamentos agressivos, o bullying enquanto fenómeno que cerca crianças mais frágeis ou impopulares, estão longe de ser uma novidade. As estatísticas dos últimos anos parecem até apontar para alguma estabilidade. No primeiro período letivo houve, em média, quatro agressões por dia em escolas, de acordo com os registos da PSP e da GNR. Mais do que no mesmo período de 2020, mas menos do que no ano anterior.
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Ainda assim, são reportados alguns sinais - qualitativos, mais do que quantitativos - sobre os quais importa refletir. Desde logo, o facto de haver casos de bullying em idades cada vez mais precoces, por vezes no pré-escolar. Os comportamentos repetidos vão instalando reações de medo de ir à escola e uma bola de neve que afeta as emoções e relações das vítimas.
As agressões físicas têm particular intensidade entre os 11 e os 15 anos, fase em que os colegas assumem particular importância no desenvolvimento. Já as agressões verbais e psicológicas atravessam idades, muitas vezes camufladas pela lógica de brincadeira. Com a desculpa de que é "a brincar", visa-se qualquer particularidade ou diferença que torna um colega alvo do grupo ou da turma.
Na equação entra o efeito de a generalidade das crianças e adolescentes ter passado a ter, desde muito cedo, um telefone sempre à mão. A forma como se usa o vídeo e as redes sociais potencia o fenómeno. Por um lado porque há menor empatia, uma "dissociação emocional" em relação à dor do outro, quando se visualiza uma agressão num ecrã. Ao mesmo tempo, essa amplificação conseguida nas redes reforça estratégias de poder e de influência de adolescentes nos seus grupos.
São muitos os projetos e ações que abordam o bullying e a violência nas escolas. Formar e educar continuam a ser as melhores armas. E esse é um trabalho concertado e transversal, que começa na família, prossegue na escola, merece insistência ao longo da vida e nos mais diversos contextos, incluindo laboral.
Trata-se de cultivar o respeito integral pelo outro. A construção de si assente no respeito e na relação com a diferença, não na imposição e na força. Trabalhando, como elemento novo de peso nem sempre devidamente avaliado, o problema da imagem e da amplificação. Até porque essa amplificação causa danos que os próprios envolvidos não medem no tempo e no alcance: há imagens que projetam muito, mas não projetam o melhor. Quando se procura atenção e influência numa sociedade que dá muito valor a cliques e gostos, corre-se o risco de distorcer e estilhaçar a própria identidade.