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Caro Orçamento de Estado,
Sou um jovem cidadão de classe média. Trabalho a tempo inteiro e a pessoa que comigo partilha o agregado familiar também. Somos uma jovem família. Temos um filho pequeno, mas nascido antes do dia em que se decretou que só quem nascesse depois teria direito a creche gratuita.
Olhamos para a fatura do supermercado e percebemos que, em alguns casos, duplicaram os valores de bens essenciais. Felizmente, somos classe média. Andamos baralhados com as contas, mas não deixamos de pensar nos nossos concidadãos com rendimentos mais baixos. Com agregados familiares maiores. Ou pessoas sozinhas.
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Em Portugal, pagamos à partida dos nossos rendimentos duas percentagens. Uma para a segurança social, outra para o IRS. Ao todo, estas duas contribuições chegam facilmente a 40%. Nalguns casos, ultrapassam. Há ainda outros descontos a fazer, seja a ADSE para funcionários públicos, ou a caixa de previdência. E já vamos perto de 50% do nosso salário em impostos, caro Orçamento de Estado. Além disso, a entidade empregadora ainda paga mais IRS ou IRC, conforme o caso, entre outros seguros e medidas obrigatórias. Todas elas importantes, não me interpretes mal.
Com a parte que recebemos - praticamente metade do salário - o chamado vencimento líquido - pagamos a renda da casa, e dela, o nosso senhorio dá mais de 20% desse valor ao Estado.
Dos produtos no supermercado, podemos pagar até 23% do seu preço em impostos, o IVA. O combustível que colocamos no carro, bem mais de metade desse valor é para o Estado. Infelizmente, não temos transportes públicos como alternativa. Vivemos longe do trabalho pois as rendas em habitações mais perto são impossíveis.
Percebeste já, Orçamento de Estado, que bastante mais de metade dos nossos salários vão para ti e por isso, esperamos bem mais de ti.
Esperamos ter acesso à saúde e a uma alimentação saudável, acesso à segurança social se por algum azar a necessitar, acesso à educação (sim, de creches gratuitas para todos e não só para alguns) esperamos acesso ao ensino superior e incentivos à qualificação. Não posso dizer ao meu filho que não vale a pena estudar. Que é igual, que ganhará igual. Esperamos estradas sem buracos e acesso a um ambiente sadio e sem poluição. Esperamos acesso à cultura, à habitação condigna.
Não espero que me dês isto tudo, mas pelo menos que regules o acesso a estes bens essenciais se for o mercado a providenciá-los. Foi para isso que inventámos a política. Foi para isso que te criámos, Orçamento de Estado.
Esperamos Desenvolvimento. Esperamos Justiça Social.
Que ninguém tenha de passar fome neste país. Que ninguém tenha de ficar sem casa.
Caro Orçamento de Estado para 2023 - preciso de te dizer estas palavras, diretamente e francamente - não estou contente contigo. Estou preocupado. Dizes que vamos ter mais rendimentos em 2023, mas os aumentos serão inferiores à inflação e até desses aumentos irás buscar o teu quinhão, a tua percentagem.
Pagar impostos é um bem essencial para sustentar a nossa vida em comunidade e sociedade, mas precisamos de ver a sua aplicação efetiva. Precisamos de saber que o nosso contributo é bem gasto, que é usado para nos fazer crescer e prosperar, a todos.
É esta a confiança do contrato social entre ti e mim. Não falhes, por favor, a tua parte. Eu não falharei a minha.