Corpo do artigo
No espaço semanal de opinião na TSF, Daniel Oliveira refere-se à nomeação de Vítor Fernandes para o Banco de Fomento, dizendo que lhe "irrita que todo o político se resuma hoje a casos e suspeitas e escândalos, porque isso diz mais sobre o bloqueio político do país do que da corrupção". "É fácil pensar que o nosso atraso resulta apenas de roubos e desonestidade, permite reduzir tudo a debate moral e não a grandes escolhas políticas, de modelo económico, de reformas no Estado", considera, acrescentando que isso "reduz a política a avaliações de caráter e desresponsabiliza-nos a todos, mas para ultrapassar isto é preciso limpar a mata de silvas".
Na sua opinião, "é preciso que os políticos, sobretudo os honestos, compreendam que o descrédito da política, tendo razões profundas, pode apesar de tudo ser minorado". Daniel Oliveira diz que há uma prevenção que pode ser feita: "Não basta dizer que umas maçãs podres não comprometem toda a democracia. É preciso tirar essas maçãs da fruteira para que o mal não seja geral. Não há dinheiro mais fiscalizado do que aquele que vem da Europa. Não é a corrupção que explica grande parte do mau uso dos fundos comunitários", lembrando que "terá sido assim nos anos 90, quando a CEE era menos exigente", mas "agora é mais difícil contornar as regras".
"Muito mais relevante é a incapacidade do Estado e das empresas executarem o dinheiro que podíamos receber, mais importante é a falta de planeamento e de avaliação do que se faz", afirma o jornalista que admite que "o problema é mais estrutural do que a falta de seriedade".
TSF\audio\2021\07\noticias\13\13_julho_2021_a_opiniao_daniel_oliveira
Daniel Oliveira considera que "existe um sentimento difuso de que a bazuca será mais uma oportunidade perdida, um fatalismo que transforma qualquer esperança num sinal de tragédia", para o qual "contribuiu a ausência de um debate político consistente sobre o Plano de Recuperação e Resiliência". "Se não se debatem os objetivos, ficam apenas os percalços", diz.
"Encerrados os debates sobre as prioridades em que tão poucos participaram, a maneira de impedir que se instale uma desconfiança generalizada na forma como será usado o dinheiro não é construir um labirinto de procedimento e burocracias que os profissionais da indignação adoram, mas que apenas tornará impossível a execução das verbas que tanto precisamos" explica o jornalista, sublinhando que é importante "escolher para os lugares chave pessoas que inspirem confiança aos cidadãos".
Daniel Oliveira recorda que Vítor Fernandes era da administração da Caixa Geral de Depósitos com Carlos Santos Ferreira e Armando Vara "quando foram dados empréstimos a Joe Berardo para a tomada do BCP" e era da administração do Novo Banco "quando Luís Filipe Vieira conseguiu ver-se livre de uma dívida de 54 milhões que foi vendida por cinco a um fundo e por oito ao seu sócio, ou seja, quando Vieira reduziu a sua dívida para um sétimo, deixando o resto para os contribuintes".
Do ponto de vista do jornalista, "Vítor Fernandes, que o Ministério Público diz ter uma relação privilegiada com Vieira, terá alguma intervenção no caso já que foi decidido pelo juiz de instrução que o ex-presidente do Benfica não o pode contactar". "Vítor Fernandes não foi acusado de nada, mas manda o bom senso político salvaguardar um processo de recuperação económica de todas as polémicas que lhe são externas", acrescenta.
Para Daniel Oliveira, Vítor Fernandes não é a pessoa indicada para dirigir o Banco de Fomento, "que terá um papel importante na bazuca". "Tendo em conta a sua ligação ao momento mais infeliz da Caixa já não o era. Tendo em conta a sua associação com Vara e Santos Ferreira no BCP também não. O seu envolvimento mais claro no processo de Vieira deixou-o totalmente fora de jogo", considera.
O jornalista lembra que "o seu nome já tinha sido escolhido e até já tinha recebido luz verde do Banco de Portugal, essa instituição que nada vê até que todos já tenham visto, mas ainda aguardava parecer positivo da CRESAP". "Com esta decisão do juiz de instrução tornou-se óbvio para o Banco de Portugal e para o Governo que a sua nomeação deixou de ser possível", refere, acrescentando que "o ministro da Economia disse que não é para já e empurrou tudo com a mesma barriga que mantém Eduardo Cabrita no lugar".
"Sejamos claros: a sua nomeação é para nunca. Não é para punir ninguém, é para preservar o que tem de ser preservado: a democracia e a clareza na utilização dos fundos de que tanto precisamos", finaliza Daniel Oliveira.
*Texto redigido por Carolina Quaresma