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A semana que passou e a semana em curso têm todos os ingredientes para festa rija, mas é mais um ano em que o Dia Internacional da Língua Portuguesa (5 de Maio), passou sem o fogo-de-artifício merecido. O lado mais visível é sempre o institucional e só este ano foi possível entregar o Prémio Camões à escritora moçambicana Paulina Chiziane, atribuído em 2021. Nesse mesmo ano, o correspondente da RTP em Moçambique foi a sua casa entrevistá-la sentada junto à fogueira que põe os paladares a burilarem refeições, perguntou se já tinha comprado o champanhe para comemorar, obrigando a escritora àquela gargalhada de vergonha, que vira a cara para o lado o diz, "é pá, por acaso apanharam-me numa altura em que estou um pouco tchonada, mas o champanhe há-de vir!"
Foi precisamente a primeira negra africana a ganhar este prémio, que no seu discurso em Lisboa referiu necessidade de um "tratamento de limpeza e descolonização", relativamente ao que vem surgindo nos dicionários de novo e do que se tem prolongado por lá, como deu exemplo da palavra "catinga" e a referência deste cheiro associado a africanos. Pois se me permite Paulina, penso como a senhora relativamente a essa necessidade, mas acho que o movimento até poderia dar ares de colonização da língua, mas com vistas mais largas. Exemplo, quem sabe em Portugal o que é estar "tchonado", sem nunca ter vivido em Moçambique? Pois acho que na Escola Primária, expressões idiossincráticas como esta, deveriam ser ensinadas aos miúdos em forma de jogo, onde todos passam a conhecer várias destas expressões e só assim, com vasto público conhecedor, se possam considerar lusófonas e não moçambicanas ou angolanas. Perdemos os truques, conhecimentos e sabedoria, relativamente a toda a Medicina Tradicional, com a descolonização, bem como o domínio e registo das línguas autóctones, não deveremos agora perder a riqueza das expressões dos nossos "Cinco Grandes de África", ao jeito de quem visita um parque natural e procura registar o "momento Kodak"!
Mais um ano passou, no qual esta data, a grande tocha que fica da colonização, esta aculturação estruturante para a unidade dos novos independentes, em que a Língua Portuguesa não foi uma vez mais celebrada com a dignidade e o espalhafato merecidos. Não há dinheiro, mas também não há criatividade para com as existentes ervas se fazer uma açorda!
Portugal-Marrocos, Alto Nível
A semana em curso terá esta sexta-feira reunião de alto nível entre os Primeiros-Ministros de Portugal e de Marrocos. Esta desculpo, porque é a primeira desde o anúncio da Candidatura tripartida ao Mundial 2030 com Portugal, Marrocos e Espanha à cabeça. Mas a próxima "Alto Nível" terá que vir vestida de "Alta Cultura", no sentido em que estes encontros entre os três países, até terem a candidatura ganha, terão que mover embaixadas culturais atrás dos políticos, no sentido de promoverem e darem a conhecer a festa com que vão receber os adeptos. Neste caso, para a maioria dos portugueses, que acha que Marrocos é só deserto, seria muito importante começar a descobrir, a partir de casa, as "multifacetas marroquinas" nos seus mais diversos aspectos e que curiosamente também passam pelas heranças deixadas pela língua portuguesa aquando da nossa passagem e permanência pelo território.
O que quero dizer é que futebol é festa e ainda nos estou a ver muito tímidos. Portugal precisa de levar a Marrocos "Embaixadas culturais" para se dar a conhecer e vice-versa, que o elo mais fraco desta candidatura é precisamente o desconhecimento e distância entre os dois povos, apesar da proximidade. As vitórias no balneário começam aqui, num planeamento um pouco "acima do joelho", para variar e não se perder a oportunidade!
A Acontecer / A Acompanhar
- 11, 12 e 13 de Maio, Conferência Internacional "The Universal Value of the African Prehistory", Centre National pour la Recherche Scientifique et Technique, Rabat, Marrocos;
- Entre 12 de Abril e 17 de Junho, em Marraquexe, Exposição "DISPOSITIONS & NOTHINGNESS", de Mariana Viana e Kátia Sá, na Galeria da Fundação Dar Bellarj;
- Todos os domingos, na Telefonia da Amadora, entre as 21h e as 22h, Programa "Um certo Oriente", apresentado pelo Arabista António José, um espaço onde se misturam ritmos, sons e palavras, através das suas mais variadas expressões, pelos roteiros do Médio Oriente e Ásia.
Raúl M. Braga Pires, Politólogo/Arabista, é autor do site www.maghreb-machrek.pt (em reparação) e escreve de acordo com a antiga ortografia.
