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Greta Thunberg é uma jovem ativista de 16 anos e cumpre bem o seu papel. Com o radicalismo, a ilusão, o sentido de urgência, e até a arrogância, próprias do ativismo e da idade, tem conseguido chamar a atenção do mundo para o desafio ambiental, para as questões climáticas, para a necessidade de termos o ambiente em conta na definição das políticas públicas.
Como qualquer ativista, e sobretudo como qualquer jovem de 16 anos, as suas preocupações podem estar certas, mas as soluções podem estar erradas, o sentido de urgência pode ser desproporcional, as propostas podem ser desastrosas, a arrogância pode não estar fundamentada e, claro, pode haver uma enorme incoerência nos seus gestos e discurso.
Mas isso não é, nem tem de ser, problema de Greta, que é uma jovem de 16 anos. A ela cabe-lhe cumprir e viver o seu papel de ativista, e ninguém suficientemente politizado desconhece a garra, a fúria, a sobranceria e até a incoerência que temos aos 16 anos, quando sabemos tudo e queremos mudar o Mundo. Não contem comigo para achar que isso não é natural nesta jovem.
É aos políticos, aos decisores públicos, que compete saber interpretar, filtrar, posicionar, as propostas e soluções que Greta preconiza, assim como lhes compete saber quem são aqueles que, com Greta, fazem parte deste movimento.
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Cabe-lhes desde logo intuir que uma jovem de 16 anos não tem, não pode ter, nem tem de ter, os conhecimentos necessários para densificar as suas propostas, ou sequer saber do seu acerto - e que muitas delas só podem vir, e não há mal nenhum nisso, de adultos a quem falta a candura, a ilusão e a vontade de Greta. Mas se não há mal que dessas pessoas venham as ideias, assim como todo o financiamento deste périplo, covinha saber quem são essas pessoas. A transparência aqui impunha-se e vejo pouca gente falar disso.
Cabe-lhes também saber que são representantes eleitos, que representam populações, que têm mandatos democraticamente conferidos, e que lhes cabe, a todos eles, porque o problema é global, definir as políticas públicas, consensualizando-as, debatendo-as politicamente com os seus eleitorados e nas instâncias próprias, e não propriamente verem-se obrigados a aceitar, a replicar, a validar, as propostas de Greta, que não só não são suas, como vêm de pessoas que não foram eleitas e sobre as quais não há qualquer sindicância.
Quando, daqui a uns anos, os vários Estados forem julgados, politicamente mas não só, pelas responsabilidades das suas políticas, serão eles, não Greta, a assumi-las. Todos os erros serão deles, não de Greta. Todas as más políticas serão deles, não de Greta. Greta não foi eleita, não é Chefe de Estado, não tem qualquer formação para o efeito nem para definir quaisquer políticas e, ícone ou não, não deixa de ser uma jovem ativista de 16 anos.
Podemos respeitá-la e admirá-la e aderir às suas causas sem com isso dar-lhe um poder imenso que não tem nem deve ter.
Cabe aos políticos não deixar que a causa ambiental, que devia ser de todos e consensual, fique aprisionada, confundida, com uma agenda anticapitalista, que vê no Ser Humano um inimigo, ignorando os progressos maravilhosos que fizemos ao longo dos séculos. Comparar a vida dos nossos antepassados com a nossa, em todos os indicadores que se escolherem, mostra como conseguimos ter hoje uma qualidade de vida inédita.
Claro que há muito a fazer em matéria ambiental, conscientes de que precisamos de preservar e deixar o planeta em melhores condições do que aquelas em que o recebemos. Mas não há qualquer problema em duvidar das propostas que cada um apresenta, muito menos há problema em querer discutir a melhor forma de chegarmos a um objetivo comum. São por isso inaceitáveis os comentários que confundem críticas às propostas de Greta com uma espécie de alheamento quanto ao problema ambiental, até porque as propostas não são, nem têm de ser, de Greta.
Greta tem cumprido o seu papel de jovem ativista de 16 anos. Boa parte dos políticos é que se têm esquecido do seu papel, esquecendo-se desde logo de quem é Greta: uma jovem de 16 anos.