Talvez com alguma injustiça e por falta de conhecimento, porque também foram tempos de progresso, associamos os ciclos negativos à Idade Média, ou idade das trevas, assim classificada pelo furor do Renascimento. Com pior ou melhor conhecimento da História, a realidade é que ninguém quer ficar outra vez às escuras. E, em boa verdade, o nível de progresso que atingimos devia manter-nos a salvo da escuridão.
No entanto, como vimos, recentemente, no "apagão" que transformou a Ibéria na "Jangada de Pedra" de Saramago, nunca fiando. Se o Nobel português isolou a península, outros ameaçam rasgar o país em dois, deixando de distribuir jornais no Interior. De nada serviram os justificadíssimos elogios do pós-apagão. A rádio, sobretudo, mas também os jornais, informaram ouvintes e leitores com um equilíbrio que contrastou com intervenções tardias ou ridículas de políticos. Nesse dia e nos seguintes, milhares de pessoas perceberam bem a importância da informação criteriosa e verificada, descontando, claro está, o conjunto gigantesco de comentadores especialistas em fios e fusíveis que encheram as televisões durante uma semana.
Não passou muito tempo desde o "apagão" de abril, mas depressa nos esquecemos da importância das notícias trabalhadas com decência, ou não estaríamos perante uma ameaça que contraria os princípios mais básicos da democracia e do progresso. É evidente que há sempre quem, quando longe dos holofotes das campanhas eleitorais, esfregue as mãos de contente com a situação, porque é impossível ignorar que os extremismos têm os jornais e rádios como inimigos.
Encontraram nas redes sociais terreno muito fértil para crescerem e, mais próspero ainda, adubado com notícias falsas e falsos profetas munidos de soluções milagrosas para tudo. Num Portugal tão pequeno, é difícil aceitar que o centralismo seja um fardo pesado que estilhaça o país em dois: junto à praia, moram os que têm direito a ler jornais, no monte, os que não o podem fazer, por não haver distribuição. Mas o problema não é novo, resulta dos tiques centralistas desenvolvidos nessas décadas de escuridão em que nos mantiveram vendados durante metade do século passado. Depois da luz de Abril, a ameaça das trevas. Outra vez.
