Corpo do artigo
"O Melhor do Mundo são as Crianças", escreveu Fernando Pessoa no "Cancioneiro", e com toda a propriedade.
A genuinidade das suas ações e opiniões, a par da ingenuidade cativante no modo como percecionam os contextos envolventes são as singularidades que pontuam os nossos dias com o toque precioso de sinceridade borbulhante, alegria e amor incondicional.
Quantas vezes, estas crianças e jovens são traídos por aqueles que deveriam, não só, cuidar, protegê-las, mas também ser o seu modelo, abstendo-se de atitudes criminosas e execráveis. Ainda que se tratando de um reduzido número de casos, o suficiente para fazer notícia nos diversos órgãos de comunicação social, um que seja já é demais.
De uma diversidade de exemplos deploráveis, elegi o acontecimento que ocorreu no início desta semana durante um jogo de futebol sub-17, e que, infelizmente, não é caso único (poderia ter sido noutro qualquer campo), e que impõe uma reflexão séria sobre o comportamento e atitudes de alguns pais, que se expõem nas parangonas dos jornais pelos piores exemplos: "Pais e jogadores numa cena de pancadaria nas bancadas, após um jogo de juvenis."
Ciente de que não sendo a regra, alguns progenitores colocam os seus filhos no desporto, julgando estar a produzir mais um Cristiano Ronaldo, um Hélder Nunes, um Neemias Queta, entre outros, procurando sucesso, em detrimento dos ganhos físicos, emocionais e mentais, da socialização e do trabalho em equipa.
Evidenciam comportamentos que devem ser banidos:
Exigindo que o treinador coloque sempre o seu "rebento" a jogar;
Insultando os jogadores da equipa adversária;
Depauperando a autoestima e autoconfiança dos seus filhos, dirigindo-lhes palavras ou expressões inqualificáveis, quando estes não atingem o desempenho expectável.
Talvez na ânsia de transferirem para os filhos desejos de infância, ou devotados apenas à competição cega que demanda a perfeição e o topo, incorrem na asneira de lhes atribuírem um horário controladíssimo, não lhes permitindo ter margem para respirar, exigindo-lhes, a todo o custo, a obtenção do sucesso, esquecendo o mais importante: a ética e, essencialmente, a autodeterminação da criança ou do jovem.
A lição destes pais (inaptos) aos seus educandos é a legitimação do uso da força física perante as contrariedades com que se deparam, culminando em conflitos e na violência extrema que todos desejamos que sejam erradicados da vida destes jovens, seja qual for a circunstância.
Pelo exposto, de modo que cenas lamentáveis como as protagonizadas no episódio aqui relatado não se tornem virais e, por isso, banalizados aos olhos da sociedade, estas pessoas deveriam ser obrigadas a apresentar um pedido sério de desculpas a todos o intervenientes e, também, aos clubes visados, ficando suspensa a sua permanência nos estádios e nos pavilhões desportivos durante os jogos.
Nas escolas, este fenómeno também acontece, exigindo uma ação robusta, concertada e consistente para que não se efetive. O respeito e o civismo são palavras de ordem, numa formação que releva a ética, seja no desporto, seja nas aprendizagens, nos projetos ou atividades de grupos. E tal como acontece nos clubes, as escolas apostam na formação, no fair play, promovendo a competição sadia.
Existem alunos e praticantes de desporto que, apesar dos péssimos exemplos que têm em casa, são verdadeiros heróis, não se revendo nos atos dos seus pais, enveredando pelo caminho do trabalho digno, apurado com ética e galhardia.