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Começa amanhã no Egipto, a COP27. A conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas reúne-se este ano em Sharm El-Sheik. Durante quase duas semanas os delegados de cada país vão debater, rever e atualizar o ponto de situação dos esforços para solucionar uma das questões mais prementes com que a humanidade se depara hoje.
A crise climática já não é coisa de futuro. É bem presente.
Em Portugal já todos sentimos as ondas de calor, os incêndios florestais, a falta de água e a seca severa que assola grande parte do nosso país, onde barragens chegaram a apenas 10% da sua capacidade de armazenamento.
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A temperatura média do planeta, quando comparada à era pré-industrial, está prestes a ser atingida em 1,5 graus. Nalguns locais do mundo, já ultrapassou mesmo essa medida. Os encontros das COP tinham por objetivo evitarmos lá chegar antes de 2030. Tinham ainda o objetivo crítico de evitar uma subida de 2,5 graus. Se esta acontecer, o nível médio do mar aumentará em cerca de 7 metros. Neste cenário, partes significativas de Vila Real de Santo António, Faro, Olhão, Portimão, Lagos, Troia, Setúbal, Costa da Caparica, Barreiro, Moita, Montijo, Lisboa, Peniche, Nazaré, Figueira da Foz, Montemor-o-Velho, Ílhavo, Aveiro, Ovar, Matosinhos, Vila do Conde, Póvoa do Varzim, Esposende, Viana do Castelo, Caminha ficarão submersas.
Mais longe daqui, em Sharm El-Sheik, a cidade resort que acolhe a COP27 é bastante peculiar. Fica espraiada ao mar vermelho, a sul do Monte Sinai. Está em pleno deserto, entalada entre secura e água salgada.
Os delegados ao aterrar no aeroporto da cidade poderão ver um campo de golfe e não serão poucas as vistas verdes de jardins, parques temáticos e parques de diversões.
É um mundo de contrastes este Egipto que acolhe e participa, com papel de liderança anfitriã, no debate pelo futuro da humanidade.
A repressão à sociedade civil naquele país tem sido constante, antes e depois da primavera árabe. Nos últimos tempos as detenções arbitrárias em redor deste evento ascendem a mais de 140 pessoas detidas. Tudo isto para reprimir as normais manifestações públicas, pacíficas e legítimas da sociedade civil no âmbito da liberdade de expressão e reunião, e no contexto deste tipo de eventos.
Nenhum Estado pode com credibilidade mostrar-se interessado em liderar as alterações climáticas se se comporta assim, prendendo grande parte da sociedade que devia estar também na mesa da discussão das soluções.
Todos os Estados devem fazer uso da sua influência para pressionar para mudanças significativas no atual estado dos direitos humanos no Egito, garantindo que a crise de direitos humanos no país não seja esquecida durante a conferência.
Até porque este tipo de eventos muitas vezes servem para lavar a cara aos anfitriões. O mundial do Qatar é exemplo parecido. Nele, a FIFA perdeu uma oportunidade para exigir ao país que promovesse melhorias nos direitos humanos. Aqui, no Egipto, as Nações Unidas estão prestes a perder a mesma oportunidade.
Oxalá os delegados à COP27 não confundam a beleza artificial verde, marítima e paradisíaca da cidade resort.
Oxalá os delegados à COP27 não confundam o sossego do local e a possível falta de manifestações e participação com um qualquer mundo sem problemas de direitos humanos e ambiente.
É que o grito dos detidos em nada é silencioso.
