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Quanto ao recente golpe do "Verão quente no Níger", obedece às premissas do mesmo caldo social caótico de todo o Sahel, os problemas de um maliano serão os mesmos de um nigerino, mas este é um golpe à parte da influência russa. Estes tinham aliás colocado uma linha vermelha no Níger, por causa das duas bases de drones americanos no território. O Níger é o maior aliado americano no Sahel, os russos sabem-no e os americanos não vão querer perder este "porta-drones" no coração de uma região infestada por operacionais e simpatizantes jihadistas, cujas movimentações são de "rato-do-deserto" e de monitorização prioritária;
Depois este golpe foi discreto demais. Até parece que o General Tchiani o tinha na cabeça há anos e só o partilhou quando teve que ser, provavelmente na véspera! O General Tchiani, Chefe da Guarda-Presidencial e líder da revolta, vive isolado no Palácio. Não sai! Tem russos, americanos e europeus a baterem-lhe à porta e não quer abrir porque quer manter o assunto isolado do exterior;
Este golpe é dos nigerinos, demonstrativo também da facilidade com que podem ser feitos a partir de dentro, sem complots internacionais. Começa aqui o grande dossiê chamado segurança, no qual tendemos a pensar a um nível macro. Fronteiras, drones, satélites, quando em terra um homem dá uma ordem e fica tudo do avesso. Neste sentido, o mesmo também aconteceu no Mali e no Burquina, mas tiveram mais luta, a tropa saiu à rua, os russos estavam presentes e activos, enquanto os populares reciclavam as bandeiras francesas em russas. Houve festa!
Há nove anos, no primeiro de agosto de 2014, François Hollande em visita ao vizinho Chade, apresentou a Operação Barkhane em Njamena, em parceria com o G5-Sahel (Mauritânia, Mali, Burkina Faso, Níger e Chade). A placa central do Sahel Ocidental tem agora juntas militares à cabeça. Sobram as pontas, Mauritânia (acesso ao Atlântico) e Chade (fronteira com o Sudão em guerra e a sofrer a pressão dos refugiados na fronteira leste)!
O Níger, pelas notícias que chegam, a CEDEAO ameaça intervir militarmente, o Senegal já enviou tropas para reforçar esse contingente, a França e os Estados Unidos da América (EUA) em silêncio e um soundbyte não confirmado que diz que o General Xis apela aos Wagner para que venham em passo acelerado para Niamey resolver o problema, juntamente com o que está em jogo para as potencias em campo, uma mina de urânio (França), duas bases aéreas (drones, EUA), controlo à imigração ilegal (UE) e uma aliado
ocidental no coração do inóspito Sahel, podem fazer do Níger um palco de disputas equivalente ao da actual República do Sudão, outra região imperativa em África para a Rússia, já que reforçaria as suas posições no Mar Vermelho, Mar Arábico e Suez. O que é que o Sahel tem? Tem o Mar Vermelho à vista para os russos. E neste sentido, é necessário colocar já a questão. "Quando é que o Chade cai?"
A Acontecer / A Acompanhar
- 27 de julho, os Tinariwen (Mali), actuarão a partir das 23.30h no Castelo de Sines, integrado no Festival Músicas do Mundo. O site do Festival apresenta a mítica banda da seguinte forma:
"A banda que popularizou a música tuaregue no mundo nasceu em 1979 na fronteira entre o Mali e a Argélia. Pioneiros do estilo "assouf" (nostalgia, em tamashek), cantam as causas do seu povo em canções que misturam ritmos tradicionais da África Ocidental com blues, folk e rock. São um sucesso global desde o início dos anos 2000 e três dos seus nove álbuns já foram nomeados para Grammys, incluindo "Tassili", que venceu o prémio na categoria World Music em 2012. Neste regresso a Sines, trazem o álbum "Amatssou", onde exploram afinidades com a música da América rural, uma produção em modo pandémico, gravada entre um oásis no sul da Argélia, Nashville, LA e Paris."
- Todos os domingos, na Telefonia da Amadora, entre as 21h e as 22h, Programa "Um certo Oriente", apresentado pelo Arabista António José, um espaço onde se misturam ritmos, sons e palavras, através das suas mais variadas expressões, pelos roteiros do Médio Oriente e Ásia.
Raúl M. Braga Pires, Politólogo/Arabista, é autor do site www.maghreb-machrek.pt (em reparação) e escreve de acordo com a antiga ortografia.
